terça-feira, 30 de agosto de 2011

Caetano Veloso e Maria Gadú

Caetano Veloso, que há décadas é considerado um dos maiores nomes de nossa música, nos últimos anos se dedicou a projetar novos talentos. Entre eles, não há dúvida de quem ganhou maior notoriedade: Maria Gadú. Paulista de apenas vinte e quatro anos, desde os treze se apresentava em bares. Em 2008 se mudou para o Rio de Janeiro, onde chamou a atenção de Caetano e outros gigantes da MPB como Milton Nascimento. Ao cantar Ne me quitte pas (uma música francesa bem famosa, ficou conhecida no Brasil com a cantora Maysa Matarazzo) para o diretor da Globo Jayme Monjardim, Gadú tirou a sorte grande. Isso porque Jayme estava produzindo a minissérie Maysa, quando fala o coração (o diretor é filho da cantora). A versão de Gadú se tornou um dos temas da produção.
Em 2009 lançou seu primeiro cd, que leva seu nome. O álbum ganhou projeção nacional imediatamente. A música Shimbalaiê - composta quando Gadú tinha apenas dez anos - tocou no país todo, principalmente depois de ser tema da novela das oito Viver a vida.  Em 2010 recebeu duas indicações ao prêmio Grammy.
O cd Caetano e Maria Gadú - Multishow ao vivo (2011) já vendeu mais de 200 mil cópias, e o dvd mais de 80 mil. Merecidíssimo, é muito bom. Tanto que eu ouço todo santo dia. O álbum traz grandes sucessos tanto de Caetano quanto de Gadú. Merecem destaque a interpretação de O quereres e Beleza pura por ambos, Tudo diferente e A história de Lily Braun por Maria Gadú e Shimbalaiê por Caetano (com direito a Gadú se emocionando ao ver o amigo e ídolo cantando sua música). É isso, vale muito a pena comprar (ou baixar, hehe) esse cd, que merece seu espaço na nossa música. Aí embaixo tem o vídeo de Caetano cantando Shimbalaiê, só pra provar a qualidade.

quinta-feira, 25 de agosto de 2011

Interlúdio - espionagem e elegância

Hoje o Cinema de quinta traz outro grande filme de Hitchcock. Alicia Huberman (Ingrid Bergman) é uma jovem festeira que se afasta do seu pai após descobrir seu envolvimento em atividades relacionadas ao nazismo. Devlin (Cary Grant) é um policial que está trabalhando na investigação de ações de grupos nazistas fora da Alemanha. Devlin recruta Alicia para uma missão anti-nazismo: se infiltrar no meio do rico Alexander Sebastian (Claude Rains), que vive no Rio de Janeiro e é um dos membros de um grupo nazista instaurado na cidade.
A história fica um pouco mais complicada quando são acrescentados à trama de espionagem um caráter mais romântico. Primeiro, Devlin e Alicia se apaixonam, apesar das diferenças e da falta de crença por parte de Devlin de que a moça se tornou uma pessoa melhor e mais responsável. Enquanto isso, Alicia não foi recrutado à toa: é sabido que Sebastian já foi apaixonado pela moça no passado, chegando à pedi-la em noivado, algo rejeitado por Alicia. Para complicar mais ainda, a missão de Alicia começa a ficar cada vez mais séria, e à medida que a moça vai conquistando cada vez mais a simpatia de Alexander os chefes pedem para que ela case-se com ele o que inviabiliza seu relacionamento com Devlin. Na frente de Sebastian, os dois se tratam apenas como meros conhecidos, o que não impede o ciúme de Devlin.
Após o casamento, Alicia passa a se aprofundar cada vez mais na sua missão. Conhecemos então quem são aqueles homens envolvidos no nazismo e do que eles são capazes. Também é apresentada com mais detalhes a mão de Devlin, uma senhora fria e cruel. 
O filme é bem elegante e interessante. Torna-se ainda mais interessante a partir da cena da festa feita por Alicia onde um jogo tenso relacionado à chave da adega, local da casa que esconde, em elegantes garrafas de vinho, a prova das reais intenções do trabalho daqueles homens em território brasileiro e à quantidade de bebida da festa, afinal, só Sebastian tem a chave da adega e Alicia a pegou escondida. A quantidade de bebida que vai diminuindo foi um ótimo recurso pra dar noção do tempo na seqüência. . A partir daí, o filme só faz melhorar. As pequenas suspeitas que Sebastian tinha quanto a relação entre Alicia e Devlin são confirmadas, ele também descobre que a moça esteve na adega e que está muito próxima a saber a verdade sobre seu trabalho. Descobre que ela é uma espiã a serviço do governo dos EUA, apesar de ter sangue alemão. É preciso dar um fim nela, matá-la, mas sem deixar rastros. A decisão tomada então, pela mãe, é cruel: matar Alicia aos poucos, envenenada, para que pareça que a moça está doente e que sua morte foi “natural”. Provavelmente a forma mais fácil de calá-la sem levantar suspeitas.
Hitchcock trabalha bem com espionagem e esse filme não é uma exceção. As intrigas, as investigações, o clima tenso, e, porque não, um romance meio tortuoso. Tudo está aqui e tudo funciona muito bem. Interlúdio (Notorious, 1946) é um filme de muita qualidade, e um dos meus favoritos da filmografia do diretor (confesso que vi apenas cerca 10 dos muitos filmes dele, mas Interlúdio realmente me agradou). Cary Grant ficou bem no papel, mas, para mim, as atenções voltam-se à Ingrid Bergman e Claude Rains, os personagens mais complexos e bem trabalhados da trama. Quanto o Sebastian de Claude Rains, não consegui detestá-lo, apesar de ele ser um vilão e de ter adotado uma maneira relativamente sádica de matar Alicia. Ele é daqueles vilões amor e ódio, que em certas horas faz coisas horríveis e em outras coisas incríveis. Prova disso é o final, onde ele mostra um certo heroísmo meio torto. Não vamos esquecer, lógico, da querida mamãe de Sebastian que tem papel crucial no filme com seu sadismo.

por Lucas Moura

quarta-feira, 24 de agosto de 2011

Menino de engenho

Num belo sábado, depois que saio da aula, estava no shopping e como de costume, entrei na livraria (se você é de Aracaju, sabe qual é). Aí enquanto andava meio sem rumo entre as prateleiras, achei Menino de engenho. Uma coincidência mais que feliz. Sempre ouvi falar do livro, principalmente depois de estudar modernismo. Além disso, minha mãe gosta muito dele, mais um motivo pra comprá-lo.
Como disse no post de domingo, é o livro de estreia de José Lins do Rêgo. E sinceramente, não poderia ter começado melhor. Aproveitando o clima social que dominava a literatura, Lins decidiu escrever sobre o universo canavieiro, onde cresceu e do qual entendia bem.
O livro narra a infância de Carlos de Melo, o Carlinhos, que vai morar no engenho de seu avô, o Coronel José Paulino, depois que seu pai mata a esposa numa crise de esquizofrenia. Carlinhos encontra em sua tia Maria a figura da mãe que perdera, apesar disso ele é criado com uma certa liberdade que beira o descuido. Assim, ao lado dos primos e de outras crianças que moravam no engenho, ele vê o mundo, aprende sobre o bem e o mal, e é apresentado precocemente a certos vícios e à adolescência (com oito anos, fazia visitas ao curral, onde fazia "bobagem" com as cabras).
O grande herói do livro é o avô, visto por Carlinhos como um poderoso e justo senhor feudal, amado por todos os seus súditos. Às vezes o coronel chega a ser comparado a um deus, de grandeza inatingível. Em consequência disso, Carlinhos, por ser neto, se considera merecedor a atenção e do mimo de todos, já que é o "coronelzinho". Uma coisa interessante: enquanto em Menino de engenho o coronel José Paulino tem essa boa imagem, em Fogo Morto ele é descrito como mais um dos poderosos da região, interessado apenas em seus lucros. Isso porque diferente do primeiro livro, Fogo Morto não é saudosista e autobiográfico.
Carlinhos conhece o amor com a prima Maria Clara, que vem do Recife passar alguns dias no engenho. A menina era mais velha e contava a ele as belezas da cidade grande. Quando a prima foi embora, ficou a saudade. Esse foi o amor puro, porque o sexo Carlinhos descobriu com Zefa Cajá, um tipo de "mulher de todos". E por ser de todos, era um poço de doenças; o menino contraiu sífilis. Depois de ficar muito doente, mas se recuperar, o avô decide "consertá-lo" mandando para um colégio interno. E é esse o tema de Doidinho, livro seguinte do grande José Lins do Rêgo. 

domingo, 21 de agosto de 2011

José Lins do Rêgo: o menino de engenho

Ao lado de Jorge Amado, é o grande prosador do Nordeste e também um dos maiores nomes do Modernismo, especialmente da 2ª Fase, a regional. Ao retratar com maestria a decadência do engenho de cana-de-açúcar, José Lins do Rêgo conquistou um enorme espaço entre os gênios de nossa literatura.
Nascido em 1901 na cidade do Pilar, na Paraíba, era descendente da aristocracia canavieira. Depois de ficar órfão de mãe e abandonado pelo pai, foi morar no engenho Corredor, de seu avô materno. Passou a infância em contato com o mundo do engenho, e viu este ser pouco a pouco substituído pelas modernas usinas. Em 1920 ingressou na Faculdade de Direito do Recife, onde participava de diversas rodas de intelectuais, nas quais conheceu José Américo de Almeida (fundador da 2ª fase modernista com A Bagaceira); casou-se em 1924 e dois anos depois se mudou para Maceió, onde se tornou amigo de figuras como Graciliano Ramos, Rachel de Queiroz e Jorge de Lima.
José Lins escrevia muito bem, e por isso os amigos o instigaram a escrever um livro. A partir daí veio a ideia de escrever Menino de engenho, lançado em 1932. O romance tem um profundo caráter autobiográfico. Nele é contada a história do menino Carlos de Melo, o Carlinhos, que vai morar com o avô depois que a mãe é assassinada pelo pai. Não vou entrar muito em detalhes porque o próximo post será sobre esse romance. Depois de Menino de engenho vieram Doidinho (1933) e Bangüê (1934) (agora sem trema), que falam, respectivamente, da adolescência e da vida adulta de Carlos. Os livros seguintes, O moleque Ricardo (1935) e Usina (1936) se unem aos três primeiros formando o chamado "ciclo da cana-de-açúcar",  fechado em 1943 com Fogo Morto, obra-prima de Lins e um de meus livros favoritos.
Adorado por público e crítica, foi traduzido para vários países. Menino de engenho, em 78 anos, vendeu mais de um milhão de exemplares e teve cem edições. O estilo de Lins era despojado, espontâneo, lembrando bastante a arte narrativa das ruas. Mas nem por isso perde em genialidade: aborda profundamente  a falência dos engenhos e outros temas como pobreza, racismo e loucura. Além do ciclo da cana, sua obra também é dividida em ciclo do cangaço (Pedra bonita e Cangaceiros) e ciclo independente (Pureza, Riacho doce, etc). Sua última obra foi Meus verdes anos (1956), livro de memórias.
Outra qualidade do cara: era flamenguista. Torcedor apaixonado, foi também diretor do clube; em 2002 foi lançado o livro Flamengo é puro amor, uma coleção de 111 crônicas e contos do escritor.
Faleceu em 12 de setembro de 1957, vítima de hematopatia. Contraíra esquistossomose nas águas cheias de caramujos dos açudes nordestinos.

quinta-feira, 18 de agosto de 2011

Reencontrando a felicidade - o luto

Becca (Nicole Kidman) e seu marido Howie (Aaron Eckhart) sofrem com a perda do filho do casal, Danny, de apenas quatro anos que faleceu em um atropelamento na porta de casa enquanto corria atrás de seu cachorro. Em meio ao sofrimento da perda, acompanhamos a rotina do casal e a maneira como cada um dos dois está passando pelo processo de luto.
Não vemos a morte do menino, o filme já inicia com a vida pós Danny. Howie parece estar mais próximo de superar a perda, ao contrário de Becca. Ela passa os dias em casa, sem fazer nada de importante, apenas vendo as várias marcas deixadas pelo filho por toda a casa. Aos poucos, ela passa então a querer se livrar dessas marcas. Tira os desenhos grudados na geladeira, doa as roupas, apaga, consciente ou inconscientemente, um vídeo do menino que havia no celular de Howie. A maior de suas decisões na tentativa de tentar esquecer o passado é sair da casa, mudar-se.
Quanto a Howie, sua grande tentativa de superar a perda é através de um grupo de ajuda para pais que perderam seus filhos e que se reúnem para tentar amenizar seu sofrimento. Essas reuniões são totalmente descartadas por Becca, que simplesmente se incomoda com aqueles pais chorosos que falam frases do tipo “foi Deus que quis assim” ou “Deus queria mais um anjinho do seu lado” para tentar se confortar. A personagem é atéia, então a religião, que funciona para muitas pessoas como um amparo, não tem chance aqui. Ele também procura estar mais próximo da mulher, tenta seduzi-la, mas o luto de Becca a faz rejeitar o toque e se sentir desconfortável em intimidade com o marido.
Além dos dois protagonistas, temos alguns coadjuvantes muito interessantes. A mãe (Dianne Wiest), que passa por alguns conflitos com a filha ao longo do filme, e a irmã de Becca, inconseqüente, imatura e grávida. O grande conflito relativo à Becca e a mãe centra-se na questão de que ambas perderam um filho, fato que faz com que a personagem de Diane Wiest acredite que pode dar um conforto à filha que de certa forma nega qualquer tipo de comparação entre seu filho e seu irmão, pois ele era na verdade um viciado em heroína que morreu de overdose, diferente de seu inocente e puro filhinho de 4 anos. Para a mãe, a dor de perder um filho é igual a todos, não importando o que esse filho fez ou deixou de fazer. Apesar dessas certas desavenças, a relação das duas é muito importante e, de certa forma, reconfortante para Becca.
Como Becca e Howie realmente não se entendem e não conseguem ajudar um ao outro, os dois acabam procurando apoio em outras pessoas. Howie passa a criar laços com uma das colegas do grupo de apoio (Sandra Oh, Grey's Anatomy) que acabou de se divorciar e Becca passa a conversar num parque com Jason, o garoto que atropelou seu filho e que se sente de certa forma, culpado por isso. Aliás, tanto Becca quanto Howie também se sentem de certa forma responsáveis pela morte de Danny, isso faz parte do processo de luto. A relação dos protagonistas com esses dois personagens é importantíssima, pois para mim é a partir desse momento que as coisas pelo menos parecem tomar um rumo melhor. Não que o final do filme deixe algo e definitivo como se o sofrimento tivesse passado e que tudo aquilo que foi passado tivesse sido superado. Não é isso que o filme quer. O filme trata o luto como algo eterno, que nunca some da vida de uma pessoa, apenas torna-se suportável. Um dos melhores diálogos é justamente em relação a isso, em que a mãe compara o luto a um tijolo guardado no bolso, um peso que sempre se carrega e que mesmo que você esqueça em alguns momentos, ele volta às suas lembranças. Na seqüência final, isso fica muito claro. A perda não vai sumir nunca, mas é preciso aprender a conviver com ela. E para suportá-la é preciso que se unam. 
Reencontrando a felicidade (Rabbit Hole, 2010) é um filme realmente bonito. Triste, mas muito bonito. Isso se deve principalmente aos diálogos que são simplesmente ótimos. Além das seqüências que já falei acima, gostaria de destacar as conversas entre Becca e Jason, sobretudo aquela em que eles divagam sobre a existência de mundos paralelos. Nessa divagação, falam como se houvessem vários mundos, onde existem vários “eu”, como se naquele momento, naquele lugar e nesse mundo eles estivessem vivendo apenas uma versão dos vários “eu” que existem. Becca responde então: “esta é a versão triste de nós dois”. Uau.
Todos os créditos também para o diretor James Cameron Mitchel, ao roteiro cheio de diálogos simples, diretos e ótimos e ao grande elenco do filme. Sobre Aaron Eckhart ele está realmente muito bem como Howie, mas não posso falar muito sobre ele por não conhecer tão bem assim seu trabalho. É sempre um prazer ver Dianne Wiest em cena, até porque, a atriz (duas vezes vencedora do Oscar por Hannah e suas irmãs e Tiros na Broadway, ambos de Woody Allen) não faz tantos filmes assim. Eu já estava com saudades. Quanto a Nicole Kidman, só tenho uma coisa a dizer: excelente. A sua atuação em Reencontrando a felicidade está no mesmo nível de seus trabalhos em Moulin Rouge (2001), As horas (2002) e Dogville (2003)! Isso é muita coisa! Até porque em andava meio decepcionado com a atriz por ela não trazer mais papéis de altíssimo nível já há um tempo. Poxa, Dogville foi em 2003 e de lá pra cá ela não tinha conseguido fazer algo que brigasse com ele até reencontrar a felicidade, com o perdão da piadinha. Seu trabalho foi lembrado no Oscar, e ela recebeu sua terceira indicação a melhor atriz – indicada por Moulin Rouge (perdeu injustamente) e vencedora por As horas. Mesmo assim, acredito que Reencontrando a felicidade tenha nível para ter sido lembrado em mais algumas coisinhas. 
Sendo assim, se você quer ver um drama adulto e de qualidade, corra que o filme ainda está em cartaz em alguns cinemas.


por Lucas Moura

segunda-feira, 15 de agosto de 2011

Leite Derramado


"Não adianta chorar sobre o leite derramado", fato. Mas a intenção de Eulálio Assumpção, nos seus mais de cem anos de idade e na sua cama de hospital público não é chorar, e sim contar sua história, num monólogo dirigido à filha, à equipe médica e a quem mais quiser ouvir. A história de Eulálio é a historia da decadência social e econômica de sua família durante dois séculos, que começa com um barão do Império e termina com o seu tataraneto, playboy carioca envolvido com o tráfico de drogas.
Eulálio era filho de um dos mais influentes senadores da República Velha, e sua ancestralidade inclui figuras como um conselheiro de D. Maria I e um senador do Império. A decadência da família começa quando seu pai é assassinado; a falta de aptidão de Eulálio para a política o impede de manter a fortuna da família aos custos de uma carreira publica. Com pouco mais de vinte anos, ele se casa com Matilde, de apenas dezessete anos, com quem tem uma filha, Maria Eulália. A coisa só vai de mal a pior: Maria Eulália se casa com um aproveitador que rouba boa parte o patrimônio da família, e depois a abandona. Seu filho é criado pelo avô Eulálio, "cujo nome ainda abria muitas portas", mas quando o menino, que também se chamava Eulálio, chega à adolescência, se envolve com ideias comunistas - isso em plena ditadura - e é morto pelos militares, mas deixa uma moça grávida. Nessa altura as propriedades dos Assumpção - um chalé em Copacabana, uma mansão no Botafogo e uma fazenda em Petrópolis - haviam diminuído e se resumiam a um apartamento de classe média na Tijuca.
Essa nova geração da família (bisneto do narrador) não é descrita, mas seu filho, sim. O mais novo Eulálio é criado pela bisavó (Maria Eulália) com todo carinho e nenhuma disciplina. Resultado: se torna um playboy envolvido com o tráfico de drogas. Inicialmente ganha algum dinheiro, mas acaba perdendo o apartamento da família, forçando o velho Eulálio e sua filha a se mudar para uma casinha na Baixada Fluminense, atrás de uma igreja evangélica. É assim que ele chega aos cem anos, vítima de Alzheimer, tratado como um caduco e aguardando a morte.
Esse foi um dos melhores livros que li esse ano. Ao longo de duzentas páginas, Chico Buarque envolve o leitor nas lembranças, geralmente confusas, de um membro de uma tradicional família do Rio de Janeiro, que viu o dinheiro e o prestígio de sua família se esvair aos poucos. Como Eulálio sofre de Alzheimer, a narração assume a fala desarticulada dele; a ordem lógica e cronológica é embaralhada. Eulálio repete muita coisa, e várias vezes acaba se contradizendo. Por exemplo, não fica claro se Matilde o trocou por outro homem ou se foi internada num hospício. Os devaneios do narrador revelam seu ciúme, sua infelicidade e sua perplexidade diante de todos os fatos ocorridos: ele nem entendia e nem aceitava a sua decadência.
Outra coisa interessante é em relação aos locais. O chalé de Copacabana se torna um prédio de edifícios, onde Eulálio vai morar, se mudando depois para a Tijuca; a mansão de Botafogo se torna sede de uma embaixada, e a fazenda "na raiz da serra" se torna uma favela, para onde o narrador é mandado depois de perder seu apartamento.
Leite derramado foi publicado em 2009. Em 2010 recebeu o Prêmio Portugal Telecom e o Prêmio Jabuti na categoria Livro do ano.

Explicações

Pois é, tudo o que é bom acaba, inclusive minhas férias. Depois de oito meses, começa o curso de Medicina, e isso deve ser suficiente pra saber que meu tempo vai ser curto, né? Peço desculpas porque o número de posts inevitavelmente vai diminuir, mas espero manter o ritmo de pelo menos dois por semana. Já os posts de cinema, deverão continuar toda quinta, mesmo com nosso colaborador Lucas voltando às aulas também.
Além disso, hoje o blog faz três meses, e por isso temos post especial com Leite derramado, de Chico Buarque.
E agora sou universitário, me desejem boa sorte!

quinta-feira, 11 de agosto de 2011

As Filhas de Marvin – Diane Keaton, Meryl Streep e um filme emocionante

Bessie (Diane Keaton) vive para cuidar de seu pai doente, Marvin, e de sua tia meio sem noção, Ruth. Cuidar deles é tudo o que ela faz há 20 anos. Após fazer exames, Bessie descobre que tem leucemia e na busca por um doador ela entra em contato com sua irmã mais nova, Lee (Meryl Streep) que vive em Ohio e com quem ela mal fala em 20 anos. Lee tem dois filhos, o mais velho e revoltado Hank (Leonardo Di Caprio), que está em um reformatório por incendiar a casa da família e o mais novo, Charlie, totalmente domesticado. Após receber as notícias sobre sua irmã, Lee decide voltar para casa para fazer os exames, apesar da distância que há entre elas. As duas tiveram uma briga séria em virtude da doença do pai. Enquanto Bessie decidiu sacrificar todos os seus sonhos para cuidar do pai doente, Lee decidiu sair de casa e não deixar que aquilo a impedisse de fazer o que queria fazer de sua vida. Isso não deu tão certo, a começar pelo seu ex-marido, admirado por Hank, e que na verdade batia nele quando ele era criança, motivo pelo qual Lee largou o marido e passou a cuidar dos filhos sozinha. Acredita que só agora está, enfim, conseguindo dar um rumo em sua vida, o que, a meu ver, é muito difícil quando não se têm uma casa para morar e um filho preso num reformatório.
Num primeiro momento as coisas parecem que realmente não vão dar muito certo. Lee e Bessie continuam tendo desentendimentos. Afinal, não dá pra fazer as pazes de uma briga que já dura décadas de uma hora para outra. Hank também não alivia a situação. Porém, aos poucos, a relação da família vai se fortalecendo. Bessie aos poucos começa a conquistar a confiança do sobrinho revoltado e as irmãs começam a se entender. Paralelamente a isso, têm-se a piora da doença de Bessie, acompanhada pela notícia triste de que nem a irmã nem os sobrinhos são compatíveis para realizar o transplante. Vão ter que recorrer ao tratamento por quimioterapia, para tentar prolongar sua vida. Sendo assim, ela não pode mais cuidar do pai e da tia e é chegado um momento de decisão para Lee: largar os três doentes em algum lugar para que passem os últimos momentos de sua vida em hospitais e asilos ou abdicar do que ela acredita ser “viver a sua vida” para dar a atenção e afeto necessários para sua família naquele momento.
As filhas de Marvin (Marvin’s room, 1996) é um filme emocionante, uma história triste e bonita ao mesmo tempo por envolver uma família totalmente desestruturada que no momento de maior necessidade une-se novamente. O filme é cheio de cenas muito bonitas. Entre elas destaco todas, isso mesmo, todas as cenas em que Diane Keaton e Meryl Streep contracenam juntas. Têm-se aí duas das maiores atrizes estadunidenses em atuações de alto nível. Dentre todas essas cenas, a melhor é a das duas conversando e se conhecendo melhor de noite no quarto, em que Lee, que está para se formar em cosmetologia, como ela mesma chama, resolve ajudar a irmã dando um novo visual a sua peruca, pois o cabelo já havia caído com o tratamento. Além dessa, destaco também Bessie e Hank se divertindo com o carro numa praia, momento que marca uma melhora na relação dos dois e a cena final que é uma das mais bonitas que vi recentemente. Não vamos esquecer, logicamente, da divertida tia Ruth que dá uma leveza ao tom dramático do filme na medida e no momento certo. A tia Ruth é uma excelente coadjuvante, muito engraçada. Sofre de uma suposta doença na coluna que lhe causa dores fortes quando é abraçada. Para evitá-la, liga um aparelhinho que fica na sua cintura e que dá impulsos nervosos que aliviam a dor. Esse aparelhinho, estranhamente, quando ligado levanta a porta da garagem. Além disso, ela é totalmente viciada numa novela brega com médicos que passa na televisão cuja protagonista se chama Coral. Ruth fala dessa novela o tempo todo, chega a se arrumar como se fosse para uma festa apenas para assistir a cena do casamento do casal protagonista, e fala tanto no programa que toda a família vê-se entendida da trama confusa e ridícula da novela. Muito divertido. O filme ainda conta com a presença de Robert De Niro como o Dr. Wally, médico de Bessie, que, junto a seu irmão Bob, secretário da clínica, também garantem momentos divertidos na trama.
Um filme excelente com atuações melhores ainda. A parceria Diane Keaton – Meryl Streep deveria ser repetida mais vezes, não porque são, coincidentemente, minhas atrizes preferidas, mas sim porque de fato são ótimas e tem uma sintonia muito boa em cena.



por Lucas Moura

domingo, 7 de agosto de 2011

Memorial de Aires - a saudade

Mês passado falei um pouco sobre Machado de Assis, no post sobre o livro 501 Grandes Escritores. O cara é excelente, provavelmente nosso maior escritor, e é claro que merece um espaço aqui no blog. Já li alguns livros dele, o último foi Memorial de Aires, sua última obra, e que infelizmente não é muito conhecida.
O memorial (diário) é escrito pelo conselheiro José da Costa M. Aires, diplomata aposentado e viúvo, entre os anos de 1888 e 1889. Aires aparece anteriormente na obra de Machado em Esaú e Jacó, mas com uma participação bem limitada. Aqui ele é narrador e importante personagem.
Vamos ao enredo: em janeiro de 1888, um ano depois de encerrar sua carreira diplomática e voltar ao Brasil, o conselheiro Aires vai com sua irmã Rita visitar o jazigo da família no cemitério S. João Batista. Lá ele vê pela primeira vez a bela e jovem viúva Fidélia Noronha, por quem desperta um certo interesse, chegando a imaginar um casamento com ela. O interesse pela viúva o leva a frequentar a casa do casal Aguiar, que tratava Fidélia como filha. Na ocasião, eles estavam completando vinte e cinco anos de um casamento extremamente feliz e amoroso, mas sem filhos. Assim, o conselheiro cria laços de amizade e afeto com o casal e com a viúva, cujo passado ele descobre aos poucos: ela era filha de um fazendeiro, o Barão de Santa Pia. Quando Fidélia quis se casar com um jovem da família Noronha, que era inimiga política de seu pai, o barão foi contra; quando resolveu permitir o casamento, repudiou a filha. Mas com pouco tempo de casada, Fidélia ficou viúva. Como o pai não a aceitou, foi acolhida pelo tio, o desembargador Campos, e pelo casal Aguiar.
Outro segredo dos Aguiar é revelado a Aires: a existência de um afilhado, Tristão, que fora criado por eles como filho, mas que partira para a Europa na juventude e aos poucos deixou de se comunicar com os padrinhos. Uma carta de Tristão, pedindo desculpas pelo tempo sem dar notícias e anunciando uma visita futura surpreende a todos. Nessa mesma época o Barão de Santa Pia adoece, e perdoa Fidélia, que vai para a fazenda cuidar dele. com o falecimento do barão, a viúva fica na fazenda para tratar dos negócios. Quando ela retorna ao Rio, conhece Tristão, rapaz inteligente e bem apessoado. A felicidade do casal Aguiar não poderia ser maior, junto a seus dois filhos postiços. Mais uma surpresa na história: Tristão, que estava se tornando amigo o conselheiro, lhe confessou que estava apaixonado por Fidélia. Como o sentimento era recíproco, os jovens anunciaram que pretendiam se casar. D. Carmo Aguiar ficou em êxtase, acreditando que o casamento impediria Tristão de voltar à Europa, mas para a tristeza dos velhos, Tristão, que tinha uma carreira política em Portugal, embarcou com Fidélia para Lisboa logo após o casamento, deixando os padrinhos na solidão e na tristeza.
Machado e Carolina
Memorial de Aires é um livro muito bonito, diferente dos outros livros realistas de Machado de Assis. Nele há fortes traços autobiográficos: o casal Aguiar é uma representação dele mesmo e de sua falecida esposa, Carolina. No romance, o casal era bastante feliz, exceto pelo fato de não ter filhos, assim como o escritor foi com sua esposa. Outra ligação: o temperamento de d. Carmo, sempre bondosa e simpática, é uma alusão a Carolina, que era conhecida por sua amabilidade. Além da vida conjugal, Carolina, que era muito culta, deixou marcas na obra do marido, onde exercia grande influência. Depois da morte da esposa, em 1904, Machado entrou em depressão, mas continuou a escrever e a trabalhar. Em princípios de 1908, o escritor pediu licença do emprego, ao qual não retornou. Faleceu em 29 de setembro, na sua casa do Cosme Velho, em companhia de amigos.

quinta-feira, 4 de agosto de 2011

Bastardos Inglórios – vamos reinventar a história?

Hoje vou falar daquele que é um dos mais recentes filmes de Quentin Tarantino, e, para mim, seu melhor filme da década de 2000: Bastardos Inglórios (Inglorious Basterds, 2009). Um filme que consegue ser inovador numa época onde o cinema não é muito inovador. Aliás, inovar é o verbo preferido de Tarantino. O cara surge no começo dos anos 90 com um estilo próprio e fez obras-primas do cinema estadunidense, como Cães de aluguel (Reservoir dogs, 1992) e aquele que talvez seja seu filme mais conhecido, Pulp Fiction (1994).
Mas enfim, Bastardos começa numa casa nos arredores de uma cidadezinha de interior da França ocupada pelos nazistas. Nessa casa, o fazendeiro vê a chegada do Coronel Hans Landa (Christoph Waltz), conhecido como o Caçador de judeus, que está na região à procura de judeus que possivelmente estejam escondidos por ali, mas especificamente a família Dreyfus, que está escondida na casa do fazendeiro há meses, mas que, apesar das constantes visitas dos oficiais nazistas, nunca foram encontrados. Estavam escondidos abaixo do piso da casa, como ratos. Os méritos do Coronel Hans, segundo ele próprio, são atribuídos pelo fato de ele pensar como judeu, ou de entender o que o ser humano é capaz de fazer quando perde sua dignidade. Ele os encontra e mata todos, ou melhor, quase todos, porque a filha daquela família que estava ali escondida, Shosana (Mélanie Laurent), consegue fugir correndo pelos campos ao som do “au revoir, Shosana!” gritado por Landa, que na verdade poderia tê-la matado ali mesmo. Se ele o tivesse feito, o desenrolar do filme poderia ser bem diferente. Esses são os primeiros 15 ou 20 minutos do filme, conhecemos dois dos principais personagens e assistimos uma das cenas que considero estar entre as melhores da filmografia do Tarantino, simplesmente incrível.
Corte para a segunda cena, onde conhecemos os Bastardos Inglórios, um grupo de homens judeus que resolve se infiltrar na França com um único objetivo: matar nazistas. Sem qualquer piedade, para que os outros possam temê-los. É um grupo formado por alguns homens de apelidos simpáticos, como o Urso Judeu, famoso por matar nazistas com golpes feitos com um taco de beisebol. Sutil não? São liderados por Aldo, o apache (Brad Pitt). E temalguns costumes interessantes. Depois de matar, escalpelar os nazistas. Aqueles que saem vivos de seus ataques recebem uma lembrancinha na testa para que todos sempre saibam o que eles fizeram, uma suástica feita por Aldo com uma navalha.
Enquanto isso, um grupo militar dos EUA, a OSS, resolve se unir aos Bastardos para dar um grande golpe no nazismo: eles pretendem explodir o cinema em que será exibida a estréia do filme “O orgulho da nação” estrelado e contando a história de um “herói” de guerra nazista, famoso por matar mais de 200 homens sozinho. Para isso, eles contam com a ajuda da atriz alemã Bridget Von Hammesmark (Diane Krueger) que é espiã inglesa. A explosão no cinema encerraria a guerra, pois os homens que lideram o sistema nazista, como Goebbles e o próprio Hitler estarão lá. 
Além disso, Shosana, que é a dona do cinema em que será a exibição, também quer matar todo mundo que está ali, realizar a vingança judia. A estréia nem seria em seu cinema (como ela foi virar a Srta. Emmanuele Mimieux, dona do cinema, não fica tão claro assim) mas o herói do filme se apaixona pela moça, e resolve mudar a estréia para seu cinema.
Para complicar ainda mais a situação, o Coronel Landa desconfia dessa conspiração feita pelos Bastardos e a OSS e pode acabar, ou não, com os planos de pôr fim à guerra.
Vou contar só uma coisinha: o cinema realmente explode, a galera lá dentro realmente morre (aparentemente não escapa ninguém) e a II Guerra Mundial realmente acaba. Não tem muito problema eu dizer o final, o que é realmente interessante nesse filme é saber como isso vai acontecer. E, pode ter certeza, é bem surpreendente.
Bastardos Inglórios é um filme fantástico, um dos meus filmes preferidos pra dizer a verdade. Tecnicamente falando é um filme muito bom, uma edição legal, uma trilha sonora legal e uma fotografia bem legal. Nessa de fotografia, minha cena preferida é a de Shosana se arrumando para a estréia em seu cinema. Da hora em que ela está olhando pela janela, com bandeiras nazistas ao fundo, à hora em que ela desce as escadas. Muito bom mesmo. O roteiro eu não preciso nem dizer o quanto é bom. Tarantino simplesmente reinventou a história. É como se Bastardos fosse um final alternativo para a II Guerra Mundial. Mistura personagens verdadeiros com fictícios. Enfim, o cara tem que ser muito criativo para fazer uma coisa dessas. O elenco também é ótimo. Destaques para Brad Pitt com seu sotaque forte e meio tosco além de um certo sadismo de Aldo, Mélanie Laurent como a sofrida Shosana (você também pode conferir o trabalho dessa atriz francesa no ótimo O concerto), e, é claro, Christoph Waltz pelo Coronel Hans Landa. Landa é extremamente inteligente, cínico, frio, cruel, tem um humor meio sádico, um homem totalmente desagradável. Waltz compôs muito bem o personagem, não poderia ser melhor. Tarantino fez um “bingo!” ao escolhê-lo para o papel. Confesso que não o conhecia antes de Bastardos e que o único trabalho feito por ele que vi após Bastardos foi Água para elefantes (2011), mas o cara é simplesmente demais.
O filme não foi muito bem lembrado no Oscar não. Foi indicado em algumas categorias, como melhor fotografia, melhor ator coadjuvante (Waltz), melhor filme e melhor diretor. Venceu apenas em melhor ator coadjuvante (Waltz) o qual seria no mínimo injusto se não tivesse ganhado! Mas, particularmente, não concordei com a derrota para Guerra ao Terror em melhor roteiro e torcia sinceramente para que ele ganhasse o melhor filme. Mas é como dizem, Bastardos é daqueles filmes que merece mais que um Oscar, merece ser visto. Visto e elogiado.

por Lucas Moura

quarta-feira, 3 de agosto de 2011

Nada Dura Para Sempre

Eu sei, eu sei. Com esse título, parece novela mexicana. Mas as três mulheres da capa não se chamam Paulina, nem Paola, ou Esmeralda nem nada do gênero. É um romance que foca três residentes num hospital de Los Angeles. "Ah, então é tipo Grey's Anatomy?" - Cara, perto desse livro Grey's é TV Globinho. Isso porque aqui a história se passa num hospital público, na década de 90, e os acontecimentos são bem mais tensos.
Em julho de 1990, o Hospital Embarcadero abriu suas portas para a nova turma de residentes. Em meio aos duzentos novatos, apenas três mulheres: Paige Taylor, Kate Hunter e Betty Lou Taft, conhecida como Honey. O fato de serem as únicas mulheres as uniu, e elas se tornaram melhores amigas, chegando a dividir o aluguel de um apartamento. Com a tensão inicial da residência, a concorrência e todo o resto, a impressão que cada uma tinha das outras era de profunda admiração, achando que estavam diante de mulheres fortes e inabaláveis. Mas as três estavam enganadas.
Paige era filha de um renomado médico da OMS, e passou a infância e juventude em acampamentos de refugiados onde o pai trabalhava. Aprendeu a falar línguas exóticas, experimentou comidas estranhas e conheceu o amor com Alfred Turner, um garoto filho de outro médico. Paige foi mandada pelo pai para estudar nos Estados Unidos,onde moraria com um tio. Seu pai morreu em uma guerra de duas tribos na África, e ela decidiu ser médica para ajudar as pessoas, como o pai fazia.
Kate, negra e de origem pobre, foi abusada pelo padrasto na adolescência, e quando engravidou dele a mãe a expulsou de casa. Uma tia a acolheu, e depois de fazer um aborto, Kate decidiu que nenhum homem a tocaria. A escolha pela medicina veio da admiração que sentiu pelos médicos que a ajudaram.
Honey veio de uma família rica, onde sempre ficava atrás das irmãs mais velhas, que eram lindas e inteligentes, enquanto ela era apenas mediana. Mesmo medíocre, Honey sempre teve um bom coração e gostava de agradar as pessoas. Com a descoberta da sexualidade, passou a ser popular, e usou seus conhecimentos para conseguir o que queria. Resolveu ser enfermeira mas os pais a obrigaram a entrar na faculdade de medicina.
A presença das três jovens médicas se tornou notória no hospital - primeiro porque elas não se abalaram com o preconceito e com os assédios dos médicos. Além disso, fatos levaram a fama delas até além das paredes do hospital: uma quase o fechou, outra foi morta e outra foi acusada de matar um paciente (eutanásia) por um milhão de dólares. O romance, que é um de meus preferidos de Sheldon, é envolvente do começo ao fim, e cheio de reviravoltas, com direito a um final surpreendente. Mais uma vez temos as grandes mulheres criadas pelo autor, além de elementos como ambição, poder, violência e sensualidade, tão comuns nos livros de tio Sid. Mas em Nada dura para sempre essa questão das protagonistas puxa mais pro feminismo do que o normal, já que as três médicas estão em constante luta contra o machismo de todos os outros médicos. O livro também fala bastante sobre a exaustiva vida dos médicos e a quase escravidão dos residentes e sobre a precária e quase inexistente serviço de saúde pública estadunidense. Como disse, um dos melhores de Sidney Sheldon.