Então, temos esta singela pérola de
2016, recentemente lançada pela Netflix (you go, Netflix!) que, até o momento,
não tem causado grande alarde no meio cinéfilo e ainda não é consideravelmente
popular, porém já traz consigo uma muito boa receptividade por parte da crítica,
uma nota 7.4 no IMDB e 75% de aprovação no Rotten Tomatoes, o que é bom para
uma produção pequena em forma e desenvolvimento, mas com um coração gigante e
pulsante que coloca um sorriso no rosto de qualquer um que confira o longa.
As amizades improváveis citadas no
título dado na distribuição nacional se referem às das seguintes personagens:
Trevor, Ben, Dot e Peaches. Vamos falar um pouquinho de cada um deles por
partes e fazer as ligações. Trevor (Craig Roberts) é um rapaz jovem que sofre
de uma grave doença chamada Distrofia muscular de Duchenne, que reduz sua
expectativa de vida ao máximo de cerca de 30 anos de idade e o impede de
realizar atividades banais e corriqueiras, como até mesmo ir ao banheiro
sozinho. Trevor necessita, então, de um cuidador disposto a atendê-lo todo o
tempo. É aí que temos Ben. Ben (Paul Rudd) é um adulto já em seus 45 anos
totalmente afundado em problemas pessoais e profissionais, sem qualquer esperança
ou perspectiva de vida, que vive num constante estado de latência após uma tragédia
passada alguns anos antes do desenrolar do filme, que decide, por vários fatores
que se relacionam a esta tragédia, ser um cuidador. Após seis meses de
treinamento, recebe seu diploma e sua primeira experiência profissional é
justamente com Trevor.
A relação entre ambos, que deveria,
num primeiro momento, ser estritamente profissional (segundo a filosofia da
escola de treinamento, cuidadores devem cuidar e dar atenção, mas mantendo uma
separação saudável com seus clientes por motivos de autoproteção) se desenvolve
em uma forte amizade à medida que a personalidade forte, o constante sarcasmo e
todas as manias (que aos poucos vão sendo desconstruídas) de Trevor são muito
bem manejados por Ben. Numa de suas tentativas de tornar a vida do jovem mais
interessante e lhe proporcionar realmente uma experiência de vida real, os dois
decidem fazer uma road trip pelos EUA com destino ao poço mais profundo do
mundo (sim.) – idéia originada de uma estranho interesse de Trevor por coisas curiosas
e gigantes espalhadas pelos EUA – passando por várias outras atrações pelo
caminho. Parece algo simples, mas para uma pessoa que em toda sua vida nunca
havia passado nada mais que uma hora longe da segurança e previsibilidade de
sua casa é um passo gigantesco. No caminho, eles agregam à viagem as duas
outras personagens de maior importância para o enredo: Dot (Selena Gomez), uma
jovem com ares de mistério, muito atraente, com um passado familiar também
conturbado e que busca uma nova guinada em sua vida na cidade de Denver e
Peaches (Megan Fergussson), uma carismática grávida muito perto de dar à luz
que viaja a caminho da casa de sua mãe. Quatro personagens que aparentemente
não guardam nada em comum além de complicados passados marcados por perdas e
danos se juntam nesse carro e ao longo do caminho criam uma conexão
interessantíssima e saudável, que, de maneira sutil, acaba efetivamente mudando
a vida de todos.
Amizades improváveis (The fundamentals
of caring, 2016) é um filme totalmente adorável. Tentando falar de forma
técnica, porém, obviamente não é perfeito. É fato notável que o roteiro, apesar
de leve e de ter doses adequadas de drama e comicidade, não tem elementos de
grande genialidade. O filme é todo e completamente previsível, não guarda
grandes surpresas ao espectador e parte de suas reviravoltas são fáceis de ser
antecipadas e não trazem grande choque ao serem reveladas. Também é fato que os
elementos doença e tragédia familiar são usados de forma maçante pela indústria
cinematográfica, especialmente nas produções que tem um caráter “tearjerker”,
que numa tradução adequada seria algo como aqueles filmes que são feitos única
e exclusivamente para arrancar lágrimas do espectador. A questão é que, apesar
de ter tudo para ser mais um desses filmes, Amizades improváveis não é. Os dramas,
apesar de serem bastante sérios, não são tratados de forma manipulativa em
nenhum momento. São orgânicos, simples, diretos, pontuais e nunca
exageradamente prolongados. O filme, aliás, aposta muito mais em momentos de
comicidade sarcástica para garantir o carisma que o torna recomendável para
aqueles que buscam um divertimento leve e otimista, mas que ao mesmo tempo
disponha os lugares comuns de forma tolerável e apreciável. Somado a estes
fatores, também temos uma excelência de atuações com destaque à presença sempre
interessante (e muitas vezes apaixonante) de Paul Rudd em mais uma de uma longa
sucessão de interpretações adoráveis (e muitas vezes clichês), uma atuação de
mestre de Craig Roberts (os dois juntos tem uma ótima química) e trabalhos
muito competentes de Selena Gomez (esqueçam o passado de estrela da Disney de
Selena Gomez. Ela está provando que é uma artista de cinema válida. Um filme de
cada vez.) e Megan Fergusson.
É isso. Amizades improváveis. Uma sucessão
de clichês funcionais, graças ao elenco super competente e ao não exagero
dramático, que montam uma experiência satisfatória.
Nota: 8/10
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