sexta-feira, 30 de maio de 2014

Filmes pro final de semana - 30/05

1. O Artista (The Artist, 2011)
O som chegou ao cinema em 1927; o primeiro Oscar ocorreu em 1928, único ano em que um filme mudou ganhou o prêmio principal - até 2012, quando O Artista venceu melhor filme. O longa franco-belga trata justamente da chegada do som às telonas e do impacto causado a muitos atores, no caso o protagonista, George Valentin (Jean Dujardin), maior astro de Hollywood e totalmente averso ao cinema falado. O filme acompanha a queda brusca de Valentin, ao mesmo tempo em que um novo rosto, Peppy Miller (Bérénice Bejo) faz sucesso nos inovadores talkies. Talvez o maior mérito de O Artista seja não caricaturar os filmes antigos, mas imitá-los com perfeição: desde as interpretações cheias de caras e bocas com legendas expressando os diálogos até a trilha sonora jazzística, além de várias referências ao cinema clássico.
Nota: 8,5/ 10
2. As virgens suicidas (The Virgin Suicides, 1999)
O surgimento do nome Sofia Coppola na direção de um filme antes de mais nada disse duas coisas ao mundo: Sofia não era só filha de um grande diretor e seu talento na direção era bem superior ao seu desempenho como atriz nove anos antes em O Poderoso Chefão pt. III. Logo em sua estreia, ficam evidentes suas características: a sensibilidade de um olhar feminino sem os excessos do feminismo raivoso e com um carinho especial pela condição humana. Assim, Sofia acompanha as cinco irmãs Lisbon, filhas de um casal católico e conservador; todas bonitas, loiras e encantadoras, cujo caso de suicídio múltiplo chocou a pequena cidade em que viviam. O primeiro suicídio, as relações familiares envolvidas, o isolamento e superproteção das meninas são esmiuçados pelo sólido roteiro, que também é da jovem Coppola. Uma estreia muito segura de uma carreira brilhante e muito promissora.
Nota: 8,5/ 10
3. Cães de Aluguel (Reservoir Dogs, 1992)
Em meio ao clima de comodismo dos anos 90, eis que explode nas telas a novidade. O original e visceral trabalho de Quentin Tarantino encontrou no público de sua época o espectador perfeito para seus exageros de sangue, risos nervosos e tensão. Tudo para que possamos nos deliciar com a forma divertida e fora de qualquer padrão convencional com a qual o diretor trabalha seus personagens e seus conflitos, ambos igualmente numerosos. Seu trabalho de estréia, Reservoir dogs, é tão impactante quanto os tiros e os palavrões lançados durante toda a duração do filme. Um genuíno choque. Audácia e originalidade sem fim cercam este conto sobre um grupo de homens perigosos envolvidos com um crime furado e suas tentativas desesperadas de escaparem imunes, ou pelo menos vivos, da confusão violenta em que se envolveram. E que violência. Litros de sangue se misturam a piadas corriqueiras, dancinhas “simpáticas”, orelhas decepadas e, sim, Like a Virgin de Madonna. Apesar de abusar de referências a grandes cineastas, Tarantino é um diretor genuinamente pop, e seu universo é muito bem pontuado por este elemento. 
Nota: 10
4. The Rocky Horror Picture Show (1975)
Science fiction, double feature... o singular musical que combina uma bizarra ficção científica e horror se tornou cult com o passar das décadas e tem uma imensa legião de fãs apaixonados por todo o mundo. Quando o inocente casal Brad (Barry Botswick) e Janet (Susan Sarandon) encontra um castelo à beira da estrada numa noite chuvosa não podiam imaginar o que encontrariam: seu proprietário, o dr. Frank-N-Furter (Tim Curry), um "doce travesti da transsexual Transylvania", seus estranhos criados e também estranhos convidados, prestes a presenciar a criação de um Frankstein moderno e musculoso. Mais que um festival de músicas que grudam, The Rocky Horror Picture Show é uma mistura de sexualidade escancarada, frases irônicas ou de duplo sentido e figurino alucinante, que o que tem de estranho, tem duas vezes mais de qualidade. Let's do the time-warp again!
Nota: 9,5/ 10
5. Se meu apartamento falasse (The apartment, 1960)
Lembrei desse filme incrível porque já faz um tempo que o vi e não seria nada mal revê-lo (vou seguir minha própria recomendação). Escrito e dirigido por Billy Wilder, o filme acompanha o simpático C. C. Baxter (Jack Lemmon), funcionário de uma seguradora que caiu nas graças dos chefes por emprestar a eles seu pequeno apartamento ocasionalmente, por algumas horas, para que eles se encontrassem com suas amantes. As coisas se complicam quando Baxter se apaixona por uma dessas amantes, que também era sua colega de trabalho (Shirley MacLaine), e pela primeira vez questiona sua amoralidade diante dos favores que fazia a seus superiores - devidamente recompensados com promoções. Comédia imortal vencedora de cinco Oscars, incluindo melhor filme, roteiro e direção.
Nota: 10

Luís F. Passos

sexta-feira, 16 de maio de 2014

Filmes pro final de semana - 16/05

1. Meia-noite em Paris (Midnight in Paris, 2011)
25 anos depois de Hannah e suas irmãs, Woody Allen estabelece um novo campeão de bilheteria entre seus filmes. A história do escritor Gil Pender (Owen Wilson), que consegue viajar no tempo na capital francesa e aproveitar a efervescência cultural dos anos 20 encantou milhões de pessoas por todo o mundo. Ao lado de pintores vanguardistas e escritores que guiaram toda a literatura do século, Gil vai descobrir que mais vale viver o presente e tentar ser feliz independente do tempo ou do espaço. Woody passa essa lição ao longo de 1h30 em belos cenários, fazendo a cidade luz e seu espírito serem os protagonistas do longa.
Nota: 9,0/ 10
2. Cisne Negro (Black Swan, 2010)
A viagem alucinógena pela mente perturbada da devotada e reprimida bailarina Nina Sayers (Natalie Portman) é um dos filmes mais comentados, elogiados e detalhados em todos seus complexos detalhes psicológicos dos últimos cinco anos do cinema americano. O controverso diretor Darren Aronofsky cria um universo de sofrimento físico e psicológico ao mergulhar numa busca irracional e violenta pela perfeição por parte da pobre Nina, que é levada aos seus limites físicos e mentais por um caminho de confrontação direta com seus desejos reprimidos, seus anseios e toda a pressão que a cerca por todos os lados. Tecnicamente perfeito, muito me agrada o tratamento que é dado ao balé por parte do filme. Esporte de sangue, dor e suor disfarçado por uma máscara de beleza e suavidade. Mas, como disse, tudo são máscaras e Aronofsky gosta de arrancá-las. Atuação visceral e inesquecível de Natalie Portman consegue ser o ponto de alto de algo que já é por si só excepcional.
Nota:9,5/ 10
3. Batman - O Cavaleiro das Trevas (The Dark Knight, 2008)
O segundo filme da trilogia Batman de Christopher Nolan se consagrou como um dos melhores da década de 2000. Dando continuidade à luta de Batman/ Bruce Wayne (Bale) para resgatar Gotham do crime, o diretor nos apresenta um vilão sádico, genial e imprevisível: o Coringa (Ledger). Atuação excepcional e incrivelmente popular junto ao público que deixou no chinelo até mesmo o Coringa de Jack Nicholson (que riu quando o jovem Ledger morreu em 2008). A presença do vilão e a técnica usada por Nolan deixam o filme sombrio, sem esperanças e dotado de um magnetismo que prende o espectador do começo ao fim. Para mim é uma bênção um filme de ação ter tanto conteúdo, numa era em que o que mais importa são explosões e heróis de corpo definido.
Nota: 9,0/ 10
4. Tropa de Elite (2007)
Tema do texto mais lido de nosso blog, o filme mais pirateado da história do país se tornou conhecido pelo mundo, vencendo nada menos que o Urso de Ouro do Festival de Berlim. Chega a ser desnecessário falar sobre o filme, o inesquecível capitão Nascimento (Wagner Moura), que tenta achar um substituto à sua altura ao mesmo tempo em que precisa pacificar favelas da zona oeste do Rio próximas à sede da diocese, por conta da visita do papa João Paulo II. Sete anos e infinitos bordões depois, o filme permanece na memória dos brasileiros, apesar de sua mensagem aparentemente não ter sido muito bem compreendida: sua principal crítica não é contra a violência das favelas, mas contra uma polícia autoritária, corrupta e o Estado que não combate a desigualdade social, raiz dos problemas.
Nota: 9,0/ 10
5. Sangue Negro (There will be blood, 2007)
Um filme excepcional em todos os sentidos. Estrelado por Daniel Day-Lewis, Sangue negro trata com muito realismo e objetividade sobre ambição a partir de Daniel Plainview(Day-Lewis), mineiro pobre que descobre no petróleo a possibilidade de obter o dinheiro e o poder que sempre quis ter. Para isso, inicialmente ele conta com nada além de suas próprias mãos e mente aguçada, construindo a cada palmo de terra cavado seu império e endurecendo seu coração. Não são poucos os desafios que ele enfrenta, entre eles o pastor de uma pequena cidade, Eli (Paul Dano), que mostra a influência que um líder religioso possui num lugarejo esquecido do deserto da Califórnia. A história forte e sólida escrita e dirigida por Paul Thomas Anderson ganha vida a partir da atuação marcante de Day-Lewis, responsável por seu segundo Oscar e sem dúvidas a melhor em muitos anos no cinema americano.
Nota: 9,5/ 10
6. Fale com ela (Hable con ella, 2002)
A história é simples: o repórter Marco (Grandinetti) se envolve com a promissora toureira Lydia (Flores), que ao sofrer um grave acidente entra em estado de coma profundo. Na clínica em que Lydia é internada Marco conhece o enfermeiro Benigno (Cámara), que é apaixonado por sua paciente Alicia. Os dois amigos se veem na mesma situação, buscando o amor de mulheres permanentemente inconscientes - o "fale com ela" do título é um conselho que Benigno dá ao repórter para que este tente diminuir sua dor. Almodóvar utiliza poesia e sutileza para contar essas tristes histórias que se encontram e são tão semelhantes, se afastando um pouco de seu estilo em que personagens femininas e homossexuais se destacam, dando lugar a dois protagonistas masculinos, e trocando a tradicional turbulência pela delicadeza da dança (inclusive as touradas são suavizadas e comparadas ao balé) e músicas bonitas e tristes, como Cucurrucucu paloma, interpretada por Caetano Veloso.
Nota: 10
7. De olhos bem fechados (Eyes wild shut, 1999)
Um médico bem sucedido cujo nome era conhecido pela alta sociedade nova-iorquina (Tom Cruise), casado com uma bela mulher (Nicole Kidman) e pai de uma adorável criança acreditava ter uma vida perfeita. Gostava de ter tudo sob seu controle e acabava menosprezando sua esposa dentro da relação, até o dia em que ela confessa que fantasiou com um oficial da marinha que passou por ela em um hotel. Perturbado pela revelação da esposa, ele parte em busca de aventuras sexuais, sem imaginar a dimensão das consequências de seus atos. Uma aventura que divide o espectador entre o que é real e o que onírico, mas com um final sólido e esperançoso. Um filme que é um dos melhores trabalhos de direção de Kubrick e que quanto mais eu penso sobre, mais fascinado fico. De gravações demoradas e intenso trabalho de edição e pós-produção, De olhos bem fechados foi o último filme do diretor, que faleceu alguns dias depois de mostrar o resultado final aos executivos da Warner, há exatos 15 anos.
Nota: 10
8. Touro indomável (Raging bull, 1980)
Quanto mais eu penso nesse filme, mais eu gosto dele e preciso me segurar pra não revê-lo. De um dos piores momentos da vida do diretor Martin Scorsese saiu seu melhor trabalho de direção, que aliado ao desempenho colossal de Robert De Niro concebeu uma trágica poesia sobre um lutador que tinha dentro de si seu pior inimigo. O talento de Jake LaMotta (De Niro) fez sua carreira ascender como um meteoro, mas seu ego, ciúme e outros demônios pessoais o fizeram cair com a mesma intensidade da subida. Trilha sonora impecável, fotografia em preto e branco deslumbrante e sequências em câmera lenta são alguns dos muitos detalhes que fazem de Touro indomável um filme que vai muito além do boxe e é extremamente competente naquilo que se propõe tratar.
Nota: 10
9. Manhattan (1979)
Numa época em que cineastas mostravam os subúrbios e a imundície social de Nova York, sendo Scorsese e seu Taxi driver o melhor exemplo, Woody Allen realiza seu maior tributo à cidade em que nasceu, viveu, realizou boa parte de sua obra e pela qual é apaixonado. Manhattan mostra a Big apple através de um preto e branco que a romantiza, embalado pelo jazz constante na filmografia de Woody. Na trama, o diretor mais uma vez vive o protagonista, que aqui é um roteirista de um programa de televisão que se demite por odiar o emprego e a má qualidade da programação e sua relação com a namorada de dezessete anos, a ex-mulher que o largou para morar com outra mulher e a amante, uma jornalista pedante. E claro, a cidade, que além de cenário é quase uma personagem e fonte constante de inspiração para a personagem de Woody - "ele adorava Nova York. Ele a idolatrava". Da mesma forma, é difícil não adorar essa encantadora história.
Nota: 10
10. Annie Hall (1977)
Seems like old times... being here with you. A música cantada por Diane Keaton duas vezes no filme transmite muito sobre o relacionamento no qual Annie Hall é centrado. Keaton é Annie, descontraída, sem rumos traçados pra sua vida, vive fazendo bicos como fotógrafa e cantora em bares, que conhece o comediante Alvy Singer (Woody Allen), um nova-iorquino judeu neurótico, metódico, meio hipocondríaco e chato, apesar de carismático. Os dois se apaixonam e engatam um namoro que logo no início do filme sabemos que não dá certo. Woody Allen conta a história do casal de forma inovadora, alternando momentos do início da relação com momentos de crise ou do cotidiano deles enquanto viviam juntos - fora muitas outras inovações que deram novo fôlego ao gênero da comédia romântica e o Oscar de direção para Woody. É quase uma unanimidade de que este é o melhor filme do diretor, que aqui traçou o esboço de muitos de seus filmes subsequentes, e diferente dos anteriores que eram mais próximos à comédia pastelão; e não é difícil ver que Annie Hall supera até mesmo outros grandes filmes como Manhattan e Hannah e suas irmãs. A naturalidade com que tudo é passado ao espectador e o tema do longa - afinal, Annie é antes de tudo um filme sobre o amor - fazem dele uma fonte inesgotável de satisfação, tornando impossível querer ver uma só vez.
Nota: 10
11. 2001: uma odisseia no espaço (2001: a space odissey, 1968)
Depois da sequência de Lolita (1962) e Dr. Fantástico (1964), o público sabia que deveria esperar por mais um filme de Kubrick. E o que veio foi muito além das expectativas de qualquer um. 2001 foi concebido por Kubrick para ser mais uma sensação do que uma história. O diretor queria fazer um filme de ficção científica ambientado no espaço, e para isso olhou primeiro para o passado, milhões de anos atrás, na aurora da humanidade, para depois dar um salto até a era das viagens cósmicas. E com muita subjetividade e efeitos visuais impensáveis até então, que lhe renderam seu único Oscar, ele nos leva a uma viagem capaz de representar o desejo humano de conhecer o que há para dentro e para fora daquilo de nós mesmos que é conhecido. Mais que revolucionar a ficção científica, Kubrick mostra que não há limites para o cinema, para a imaginação e o talento de um artista.
Nota: 10
12. O demônio das onze horas (Pierrot le fou, 1965)
Dentre os poucos filmes de Godard que já vi, talvez Pierrot le fou seja o mais complexo, mas é de longe o que eu mais gosto. A história se desenvolve a partir da fuga de Ferdinand (Belmondo), um professor universitário que deixa pra trás a vida burguesa para cair na estrada com sua amante Marianne (Anna Karina). Se a Nouvelle vague queria quebrar princípios e reinventar o cinema, é só ver Pierrot para saber que eles conseguiram. A linearidade da história, marcada pela narração dos protagonistas, que se revezam  nos contando seus fatos e pensamentos, é quebrada várias vezes. Como bom filme de estrada, o que não falta aqui é filosofia e interrogações, até porque Godard mantém o padrão de diálogos que mais parecem interrogatórios. O casal de fugitivos é feliz? O que eles esperam do futuro? Afinal, Marianne corresponde aos sentimentos de Ferdinand? E mesmo sendo tantas as perguntas, as deixamos de lado porque parece que eles querem apenas seguir em frente, vendo beleza onde ninguém mais vê e estando lado a lado na jornada.
Obs: o título brasileiro não é mais uma viagem dos tradutores; é o nome do livro no qual se baseia o filme.
 Nota: 10
13. Lolita (1962)
Há quem diga que Lolita é o primeiro filme realmente 'de Kubrick', pois é o primeiro que dá pra saber que nenhum outro diretor filmaria. Afinal, haja ousadia para adaptar a polêmica obra de Vladimir Nabovok, que fora censurada em vários países quando lançada. Lolita acompanha o professor universitário Humbert Humbert (James Mason) e seu desejo doentio por uma adolescente de catorze anos, Lolita, que o levou a se casar com a mãe desta só para se aproximar dela. Com olhares furtivos e escrevendo em seu diário, Humbert guarda para si a obsessão pela menina, enquanto a mãe se atira sobre ele sem algum pudor. Reviravoltas no filme parecem contribuir para o sucesso,de suas intenções, mas outras reviravoltas deixam a história ainda mais interessante, e surpreendentemente fresca mesmo cinquenta e poucos anos depois de seu lançamento.
Nota: 10
14. Um Corpo que Cai (Vertigo, 1958)
Eleito há dois anos o melhor filme de todos os tempos e tirando Cidadão Kane de um lugar que ocupava há 50 anos, Um corpo que cai não foi bem recebido por público e crítica na época de seu lançamento, e só vinte anos depois passou a ser visto como uma das obras-primas de Alfred Hitchcock; francamente, não vejo o porquê de tal rejeição inicial. O filme tem uma das melhores reviravoltas do cinema, e aparenta não ter só um clímax, e sim um clímax principal que sucede e precede outros dois secundários. Na trama, James Stewart, que foi um dos mais frequentes parceiros de Hitchcock, interpreta um detetive que investiga a esposa de um antigo colega que aparentemente está possuída pelo espírito da bisavó. O filme é marcado pelo medo de altura da personagem de Stewart, que num acidente no alto de um prédio viu um colega da polícia morrer ao cair do telhado. Um suspense complexo e muito bem elaborado que envolve o espectador como poucos.
Nota: 10
15. Casablanca (1942)
You must remember this... e quem conseguiria esquecer? Uma das histórias de amor mais conhecidas de todo o cinema, ambientada no Marrocos em meio à Segunda Guerra Mundial , é um misto de paixão, ciúme, ressentimento e saudades de uma época em que nem mesmo o Exército alemão parecia ser capaz de separar um casal feliz, Rick (Humphrey Bogart) e Ilsa (Ingrid Bergman). O reencontro desse casal em Casablanca, anos depois, ocorre em meio a uma situação perigosa: um líder da Resistência francesa que tem a chance de fugir do alcance do Reich - mas que é o marido de Ilsa, e o detentor dessa chance acaba sendo Rick. Surgem as dúvidas: até que ponto as lembranças e o ressentimento influenciariam a decisão de Rick? Ainda havia amor? Ótimo roteiro cheio de diálogos afiados e pequenas piadas, elenco perfeito, história envolvente e uma das músicas mais conhecidas de todo o cinema são os ingredientes para uma obra que atravessa décadas incólume e segue conquistando fãs.
Nota: 10

Luís F. Passos

quinta-feira, 15 de maio de 2014

Era uma vez no Oeste - a Ópera italiana no Velho Oeste



As décadas de 40 e 50 representaram o apogeu do western americano. Nomes como John Ford, Sam Peckimpah foram responsáveis pela expansão do gênero, que se tornou um dos mais queridos pelos americanos. Nos anos 60 o western persistia, mas crise que atingia a industria de Hollywood chegou para todos os tipos de filme, e não foi diferente para ele. Mesmo sendo um estilo adorado nos Estados Unidos, acabou perdendo um pouco de sua força, ao contrário do que acontecia na Itália com os chamados western spaghetti, de onde se destacou um jovem e promissor diretor, Sergio Leone.

Era uma vez no Oeste (C'era una volta il West / Once upon a time in West, 1968)é um dos três filmes que tiveram excelentes restaurações sobre os quais queria falar aqui no blog. A sequência de abertura diz muito sobre o porquê. Enquanto três homens esperam por um trem numa pequena e decrépita estação, são incomodados por uma goteira e uma mosca - os mínimos detalhes são explorados. Assim que o trem chega, o som da gaita tocada por um homem que permanece sem identificação até o fim do filme põe o recém-chegado de frente àqueles que o esperavam, e começa o bang bang. A inesquecível cena é o ponto de partida para a história guiada por quatro protagonistas: Harmônica, apelido recebido pelo desconhecido da gaita (Charles Bronson); Frank (Henry Fonda), o sádico bandido líder de um grupo de criminosos; o bandido Cheyenne (Jason Robards), líder de outro grupo e Jill (Claudia Cardinale), ex-prostituta de Nova Orleans que chega no deserto para recomeçar a vida ao lado de sua nova família.
O enredo se desenvolve a partir da chegada de Jill à fazenda de seu marido, quando encontra ele e os três enteados mortos. A chacina, inicialmente sem explicações, é ligada ao grupo de Frank, mas por muito tempo o motivo é desconhecido. É a chegada de Harmônica e a aproximação de Cheyenne que vão esclarecendo o porquê da morte da família de Jill, tendo relação direta com com Morton, o magnata das ferrovias que mantém ligações com Frank. Aos poucos, também é explicada a razão da chegada de Harmônica ao lugar, motivada por um antigo desejo de vingança e reforçada pela vontade de ajudar a jovem viúva, junto a Cheyenne.
Há um erro na tradução do título original italiano: C'era una volta il West, ou seja, "Era uma vez o Oeste", e não "no Oeste". O título sugere a destruição da identidade do Oeste e do que aconteceu ao seu povo com a chegada das ferrovias graças à ambição e violência dos empresários, representados no filme por Morton. Arrasar as paisagens e matar os colonos que não cedessem suas terras era algo comum na segunda metade do século XIX, quando houve a expansão ferroviária rumo à Costa Leste americana. Enquanto John Ford em Rastros de Ódio (1956) usou a paisagem árida para representar a dificuldade dos colonos em se estabelecerem no deserto, Leone a usa (inclusive gravou no Arizona e em Utah, locações preferidas de Ford) para mostrar que a força da locomotiva não era detida nem mesmo pela insalubridade do ambiente, reforçando que os empresários eram como "lesmas que deixam dois brilhantes e pegajosos trilhos".
O estilo forte e inconfundível de Leone inicialmente não foi bem recebido por crítica e público, que só anos mais tarde entendeu que não era pretensão do diretor criar um western convencional, nem mesmo um western spaghetti como os italianos tanto gostavam e o mundo hoje cultua. É basicamente um filme italiano, com fortes influências da tradição da ópera, que se passa no Velho Oeste. Muito além de tiroteios constantes, Era uma vez no Oeste é sensivelmente contido e mostra seu valor desde a grandiosidade dos amplos espaços até os closes em olhares que muito dizem sobre luto, ressentimento, orgulho e vingança.

Nota: 10

Luís F. Passos

terça-feira, 6 de maio de 2014

O Despertar de uma Paixão - amor que vem do improvável

O romance pouco usual de 2006 O despertar de uma paixão (The painted veil) conta com uma incrível parceria: a dos atores Edward Norton e Naomi Watts. Ambos, além de protagonizarem o trama, também tiveram importância crucial para a produção e o lançamento deste pequeno, porém grandioso, filme. Com ares de cinema clássico americano e a elegância do cinema europeu, este filme traz um enredo muito simples e puro em suas propostas, mas muito atípico em seu desenvolvimento.
Em O despertar de uma paixão, temos um jovem casal de ingleses, Kitty (Naomi Watts) e Walter (Edward Norton). O único motivo que levou Kitty a casar-se com Walter foi exclusivamente encontrar nele a chance perfeita de fugir, literalmente para o mais longe o possível, da desagradável presença de sua mãe. Já Walter sim tinha intenções nobres com relação à moça. Encontrava-se totalmente apaixonado por ela e disposto a fazer de tudo que tivesse a seu alcance para torná-la feliz. Recém-casados, ambos partem para a Xangai dos anos 20 onde Walter iria trabalhar em seu ofício de bacteriologista.
As gigantes diferenças, a busca infrutífera por uma figura projetada de seus sonhos em pessoas reais e a balança de sentimentos totalmente desfavorável são o necessário para fomentar a degradação cada vez mais óbvia e previsível ente o relacionamento dos dois. O que nunca foi firme logo se deteriora conforme Kitty toma decisões irresponsáveis e passionais. Como castigo para a traição da esposa, Walter lhe dá um ultimato: ou lhe dá o divórcio acompanhado de um verdadeiro escorraçamento social ou lhe dá o divórcio de forma tranquila, após ela passar um tempo com ele vivendo em um distante vilarejo perdido no meio do país e assolado por uma epidemia mortal de cólera.
É neste momento que o filme toma uma nova forma. Apesar de todas as condições predisporem a uma separação cada vez maior do enfraquecido relacionamento conjugal, o que ocorre na verdade é o contrário. Num gradativo processo que se inicia com respeito e admiração, tirando o desprezo ofensivo que havia sido colocado entre os dois, e o substituindo, por fim, por paixão propriamente dita.
Tudo isto não é necessariamente impensável, sendo o caminho mais fácil e tradicional a ser seguido. No entanto, O despertar de uma paixão é um filme muito bom. Sua trama poderia facilmente cair nos lugares comuns clássicos, mas todo o enredo se passa num contexto tão exótico e tão incomum que o filme ganha muitos pontos num quesito de originalidade, tornando-o, além de algo diferente do padrão, algo muito interessante em termos visuais, visto que a ambientação histórica daqueles lugares tão belos quanto inóspitos de um lugar tão pouco explorado visualmente pelo cinema ocidental como o interior da China torna a fotografia belíssima. Fotografia essa que ainda vem acompanhada de uma elegante e sóbria trilha sonora e das mais elegantes e sóbrias ainda atuações de Naomi Watts e Edward Norton. Uma dupla de atores sensacionais que não competem em tela para mostrar quem é mais competente (o que é impossível de determinar), mas que trabalham em simbiose, tornando impossível conceber Kitty sem Walter, e vice-versa. As atuações são elegantes e são cruas. Nada muito enfeitado. Nada de drama exagerado. Sentimentos crus, puros e diretos que combinam muito com o ritmo lento com que a trama se desenrola. Lembrando que lento não quer dizer entediante.
Também vale lembrar que O despertar de uma paixão ainda coloca como segundo plano de sua narrativa o interessante e problemático conflito existente em virtude do imperialismo europeu do século XIX, pontuando o filme de momentos de maior tensão. Não muita tensão – nada que tire o foco do casal central.
O despertar de uma paixão: não muito quente, não muito frio. Um filme interessante, belíssimo (tão correto e harmônico que é como ver uma pintura clássica) e muito bem produzido que não nos excita demais, mas jamais nos decepciona.

Nota: 8,0/ 10

Lucas Moura

sábado, 3 de maio de 2014

Filmes pro final de semana - 02/05

1. E ai, comeu? (2012)
Comédia nacional, de Bruno Mazzeo, com esse título, dá pra esperar coisa boa? Não, mas o filme surpreende. Pelo menos dá uma surra no infame Cilada.com, também de Mazzeo. E ai, comeu? é centrado em três amigos que se reúnem quase todo dia num boteco para falar sobre a vida, mulheres e sexo. Honório (Marcos Palmeira) é um jornalista machão que começa a enfrentar problemas no casamento, Fernando (Mazzeo) acabou de se divorciar e ainda sofre com isso - e é perturbado pela vizinha de 17 anos - , e Afonsinho (Emílio Orciollo Neto) é um rico que sonha ser escritor e vive se relacionando com prostitutas. No bar, atendidos pelo sempre presente garçom Jorge (Seu Jorge), os três sempre estão tentando descobrir qual o papel deles num mundo povoado e (segundo eles) dominado pelas mulheres. Hilário e não tão infame.
Nota: 7,5/ 10
2. Inverno da Alma (Winter's Bone, 2010)
Após ser indicada ao Oscar em 2011, Jennifer Lawrence ganhou muita projeção com Jogos Vorazes e depois com O lado bom da vida, com o qual venceu o Oscar ano passado. Mas seu melhor papel ainda é aquele pelo qual ela recebeu sua primeira indicação - e pra mim, seu melhor filme também. A personagem de Jennifer, Ree, é uma garota de 17 anos que precisa encontrar o pai para que ela, sua mãe e seus irmãos pequenos não sejam despejados de sua casa. O pai, que tinha envolvimento com o crime, havia saído em condicional e deixado a casa como garantia caso fugisse - e estava desaparecido. Para encontrar o pai, Ree precisa ir atrás de gente perigosa, sem escrúpulos nem piedade, que somado à já difícil vida num lugar frio e árido, exige da jovem força e maturidade que ela precisa adquirir sem apoio de ninguém. 
Nota: 8,5/ 10
3. Gangues de Nova York (Gangs of New York, 2002)
Sou muito suspeito pra falar de Scorsese, mas é difícil não se render a Gangues de Nova York. Show de sireção, roteiro, efeitos, trilha sonora, elenco. Elenco encabeçado por Daniel Day-Lewis e Leonardo DiCaprio, que vivem rivais nos subúrbios nova-iorquinos da segunda metade do século 19, num misto de vingança e disputa pelo domínio do crime numa grande região da cidade. Day-Lewis vive Bill, "the Butcher", que detém o controle da região de Cinco Pontas desde um memorável combate contra William M. Tweed - e considerava-se inatingível, até que o filho de seu antigo rival (DiCaprio) aparece sedento de vingança. É Scorsese explorando a história de sua cidade por um ângulo não muito conhecido e o talento de dois grandes atores: Day-Lewis, colossal como o açougueiro do crime, e DiCaprio, que faz aqui a primeira das cinco parcerias com o diretor.
Nota: 8,5/ 10
4. Arizona Nunca Mais (Raising Arizona, 1987)
Um clássico na filmografia dos Irmãos Coen e sem dúvidas um clássico contemporâneo. Segundo filme da dupla que sacudiu o cinema nos anos 80, Arizona nunca mais é uma comédia escrachada e caricata que tem em Nicolas Cage um anti-herói atrapalhado, o ex-penitenciário HI, que acaba se casando com uma bela policial da cadeia onde cumpria pena, Ed (Holly Hunter). O casal recém-formado vive num mar de felicidade até descobrir que não podiam ter filhos - e bolam um plano para sequestrar um dos quíntuplos gêmeos de um milionário. As investigações do sumiço do bebê, a contratação de um pistoleiro implacável pelo pai da criança, o aparecimento de dois amigos fugitivos de HI e claro, a maluquice do casal sequestrador são os ingredientes certos para a estranha e exagerada comédia com tons de western que ainda conquista fãs quase trinta anos depois.
Nota: 9,0/ 10
5. Um Estranho no Ninho (One Flew over the Cuckoo's nest, 1975)
Tá aí um filme que consegue me deixar emocionado de verdade. A história do malandro Randle P. McMurphy (Jack Nicholson), que se finge de louco para sair do presídio onde cumpria trabalhos forçados e vai para um hospício é um convite à reflexão sobre a psiquiatria manicomial e principalmente sobre liberdade e desafio ao sistema. Isso porque McMurphy vai encontrar o verdadeiro diabo de saias e touca: a enfermeira chefe Ratched (Louise Fletcher), que odeia toda e qualquer coisa que atrapalhe a disciplina e perfeita harmonia em seu hospital psiquiátrico. Onde esperava encontrar vida mansa, o bandido vai encontrar um ambiente tenso e sufocante, em que regras antigas e rígidas valem mais que a felicidade ou mesmo a vida humana. Filme excelente que faturou os cinco prêmios principais do Oscar, filme, direção, roteiro adaptado, ator (Nicholson) e atriz (Fletcher).
Nota: 10

Luís F. Passos