sábado, 2 de outubro de 2021

Livros pra outubro


Lituma nos Andes
(Mario Vargas Llosa, 1993)
O cabo Lituma, velho conhecido dos apreciadores da literatura de Vargas Llosa, aparece novamente, dessa vez em missão em altas altitudes. Trabalhando apenas com seu subordinado, o guarda Tomás Carreño, num posto com estrutura débil, que fica num acampamento de operários da construção civil, Lituma está diante de um caso complicado que mistura investigação criminal com histórias sobrenaturais: o desaparecimento seriado de homens do acampamento e da região. Seriam vítimas de crimes comuns, da guerrilha socialista Sendero Luminoso, que aterrorizava a região, ou de míticas criaturas que habitam as montanhas? O cabo enfrenta diversas dificuldades: a falta de pessoal, falta de recursos e de colaboração dos trabalhadores, que não confiam na Guarda Civil. Quase todos os capítulos do livro são trazidos em três partes: a primeira acompanhando Lituma e suas investigações, a segunda mostrando ataques dos guerrilheiros e a terceira narrando as desventuras amorosas do guarda Carreño com uma mulher que marcou sua vida - e assim vemos mais uma vez a maestria da escrita de Mario Vargas Llosa, conduzindo o leitor com bastante naturalidade entre diferentes épocas e locais, construindo o quebra-cabeças dos mistérios de Lituma nos Andes.
Nota: 10


A morte e a morte de Quincas Berro D'água
(Jorge Amado, 1961)
Esse pequeno, porém delicioso e pitoresco livro de Jorge Amado nos mostra os estranhos eventos que envolvem as duas mortes de Quincas Berro D'água, o rei dos vagabundos da Bahia. Outrora um funcionário público exemplar e cidadão da respeitosa classe média soteropolitana, Quincas vivia numa zona de Salvador em meio a pescadores, estivadores, bêbados, malandros e prostitutas. Mandou a família e as convenções sociais para os ares e passou a vadiar e se embebedar a todo o tempo - só bebia álcool, e ganhou o apelido Berro D'água depois de se assustar por beber água e dar um grito que estremeceu a Cidade Alta. No dia de seu aniversário, Quincas é encontrado morto por seus amigos bêbados, e a família decide fazer um enterro digno para enterrá-lo como o respeitável Joaquim Soares da Cunha; mas com umas doses de cachaça e outras tantas de loucura, os companheiros de malandragem carregam o defunto por vielas escuras, numa aventura onírica onde se confunde o que é real e o que é efeito do álcool. Livro que se tornou um filme maravilhoso com o inesquecível Paulo José no papel de Quincas. 
Nota: 10

Morte e vida severina
(João Cabral de Melo Neto, 1956)
"O meu nome é Severino, não tenho outro de pia...". Assim o retirante Severino (que é Severino de Maria, sendo Maria a Maria do finado Zacarias) se apresenta a quem ouve a narração de sua saga partindo do interior para o Recife, fugindo da seca e da miséria. Através da poesia rica de João Cabral, temos o engajamento social sobre a vida brasileira, padecendo pelo descaso dos poderosos e sucumbindo de modo cruel e dramático, tendo a morte como companhia constante. Chamada pelo autor de "auto de Natal pernambucano", a obra faz convergências com o nascimento do menino Jesus, numa releitura laica em que a redenção se daria não pela fé, mas pelo trabalho. Apesar disso, a esperança parece distante: "Essa cova em que estás / com palmos medidas / é a conta menor / que tiraste em vida (...) é a parte que te cabe deste latifúndio". O magistral poema se tornou peça de teatro em 1965, musicado por um jovem de 21 anos chamado Francisco Buarque de Holanda. Conhecem?
Nota: 10

Noites do Sertão
(João Guimarães Rosa, 1956)
Em 1956, meses antes de lançar Grande sertão: Veredas, Guimarães Rosa havia publicado seu segundo livro, uma coleção de sete novelas chamada Corpo de Baile. Entre 1964 e 1965, o autor dividiu a obra em três livros: Manuelzão e Miguilim, com duas novelas, No Urubuquaquá, no Pinhém, com três, e por fim Noites do Sertão, com duas. Este último traz duas estórias grandes, densas e que se destacam na obra roseana por abordarem a sexualidade das personagens, mostrada como força arrebatadora que vai de encontro a preconceitos e sobrepuja convenções sociais. Tanto Lão-Dalalão quanto Buriti, títulos das duas novelas, são inesquecíveis. Recheadas de todos os bons ingredientes que Guimarães Rosa gostava de usar: neologismos, arcaísmos, frases de efeito e as marcas culturais e geográficas do sertão mineiro - em Buriti, uma árvore de quase 70 metros de altura dá nome à estória e ao local em que se passa. Uma personagem vegetal envolta por mistérios e segredos, tal como todo o universo do Corpo de baile.
Nota: 10

Luís F. Passos