Qual não foi a alegria do humilde cinéfilo que vos escreve quando, em abril, foi anunciada a reinauguração de um cinema de rua na minha cidade? AEEEEEW! Em maio houve um festival de cinema francês, que foi um período de testes, e em julho o cinema abriu de vez. Programação alternativa, preços camaradas e uma opção à ditadura da grande rede de cinemas dona dos dois outros cinemas da cidade. E olhe que estamos falando de uma capital.
Desabafos à parte, o último filme que vi lá foi Frances Ha, simpático filme americano do ano passado que chegou ao Brasil e vem despertando o interesse de críticos e conquistando fãs, não só aqui mas por vários países. O longa é focado em Frances, garota de quase trinta anos muito carismática por ser encantadora e desengonçada, com cada adjetivo na medida certa. Frances estuda numa escola de dança, onde além de aluna tem um "cargo" de dançarina substituta, com a possibilidade de participar de espetáculos e ganhar um dinheirinho; o que, junto das aulas particulares que ela arruma de vez em quando, garante seu sustento. Logo no início do filme vemos Frances com o namorado, que a convida para morar com ele, e recusa, segundo ela por dividir o apartamento com sua melhor amiga e porque o relacionamento deles já não funcionava - a ausência de sexo era um forte sintoma. De volta para casa, ela encontra sua amiga, Sophie (Mickey Sumner), conta as novidades e Sophie lhe conta que irá se mudar para a casa do noivo. E cai o mundo de nossa protagonista.
Frances é a representação de um tipo muito comum em Nova York: jovem nascida no interior que vai à cidade grande depois de formada, não vê seus sonhos realizados de imediato e vai se virando como pode, se esforçando sem deixar a peteca cair. E nisso Frances é ótima. Numa espécie de "jogo do contente" de Pollyana amadurecido, ela nunca se deixa perturbar e tira ânimo sabe Deus de onde para seguir em frente, e sabe aproveitar como poucos as pequenas conquistas, como numa das melhores cenas do filme, em que ela sai dançando pelas ruas ao som do clássico Modern love de David Bowie. Mais que isso, Frances também é um exemplo de uma pessoa na fase em que não sabe o que fazer da vida, e mal entende o rumo que a vida toma. e aqui é um dos casos em que essa fase parece teimar em não acabar.
E porque este simpático longa vem chamando tanto a atenção? Frances Ha não é só mais um queridinho do cinema alternativo, como também desponta como um filme que se liberta das amarras das quais o próprio cinema alternativo não se livrou. E essa quebra rumo à liberdade nos lembra o que? Nossa querida nouvelle vague. E mesmo despretensiosamente, o filme puxa a sardinha pro movimento francês; na fotografia em preto-e-branco, tomadas em lugares abertos onde há bastante movimento, os cortes muito repentinos e alguns diálogos que parecem conflitos, além, claro, da trilha sonora cheia de músicas de Georges Delerue, compositor que foi colaborador assíduo de Truffaut e Godard. E por falar no diabo, há uma frase dele que diz que basta uma arma e uma mulher para se fazer um filme. Aqui não há armas, exceto o jeito estabanado de Frances, golpe baixo para quem assiste e logo se rende à heroína da big apple.
Nota: 10
Luís F. Passos
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