domingo, 27 de janeiro de 2013

Lincoln - humanização do mito

De todos os heróis estadunidenses, sejam eles fictícios ou não, o mais importante, o mais querido e o mais respeitado no país é o político e ex-presidente Abraham Lincoln, o principal responsável por uma fatia importantíssima da história dos EUA, e, de certa forma, do mundo, por ter sido o presidente que permitiu a abolição da escravidão em solo estadunidense e foi durante seu mandato que se deflagrou a Guerra de Secessão, sangrento conflito armado baseado em interesses políticos, culturais e principalmente econômicos, que iam muito além da questão racial, entre o Norte abolicionista e o Sul escravocrata do país. Conflito este que demorou muitos anos e levou milhares de vítimas diretas e indiretas. Todos sabem que o Norte industrial e economicamente mais forte e melhor estruturado, levou a melhor sobre o Sul rural. Nesse contexto histórico, ainda havia a formação do que viria a se tornar a democracia americana como a temos hoje em dia.
Lincoln, a mais nova super produção de Steven Spielberg, mergulha neste fatídico e importantíssimo ano de 1865. Escancara as portas da Casa Branca e do Congresso para nos mostrar toda a sequência de fatos, debates, conspirações, alianças e, até mesmo, chantagem e corrupção por trás da sanção da chamada 13ª emenda. Esta emenda, que viria a ser incluída a até então intocada constituição do país, viria a pôr em modos legais que todos os homens são iguais perante a lei. Ou seja, que não havia sentido manter o opressivo e desumano sistema escravocrata. No meio de tantos homens envolvidos, um, obviamente, era a cabeça e a alma de tudo: Abraham Lincoln. Se a lei foi sancionada foi devido a seu envolvimento pessoal e sua determinação em fazer o que acreditava ser o melhor para a “América” e para os “americanos”, indo de encontro a uma oposição política e social que se posicionava impassível a tal transformação, seja por motivos econômicos, culturais e até mesmo religiosos (“como tratar com igualdade a quem Deus criou desigual?”).
O filme apresenta-se com excelência em diversos pontos. Aqui, Spielberg saiu quase totalmente dos campos de guerra, onde já mostrou ser mestre, e fixou-se nos debates. Nas discussões. Na vida política dos EUA do século XIX e na mentalidade do homem da época, gerando momentos que vão dos mais tensos aos mais cômicos. Seu trabalho de caracterização da figura legendária de Abraham obviamente é nacionalista. Não tem como evitar. Por mais que o filme não traga, a nós brasileiros, um caráter efetivamente emocional, imagino que tenha um grande significado para os estadunidenses, pois se trata de uma figura extremamente presente na vida do país mesmo após um século e meio de sua morte (assassinado num teatro após a legalização da 13ª emenda) e Spielberg não tem como fugir dessa influência maciça. De certa forma, o filme faz parecer que o interesse pelo fim da escravidão foi mais baseado em valores morais que em valores econômicos, sendo que não é assim que as coisas funcionam. Desde que o mundo é mundo, quem manda é o dinheiro.
De qualquer forma, o maior mérito da produção é a humanização de Lincoln. Ele nos é apresentado em seus mínimos detalhes pessoais que vão muito além de discursos eloqüentes, mas de pequenos detalhes, inseguranças, medos, motivações e de toda a construção de seu relacionamento familiar, principalmente em relação a esposa Molly (Sally Field). A sua interpretação coube ao sempre fantástico e sempre excelente Daniel Day-Lewis, que transformou uma dificílima personagem em alguém por quem se interessar pessoalmente. Não pelos seus feitos, e sim pela sua pessoa. Sensibilidade sem perder uma força gigante.

Obs: Day-Lewis caminha a passos largos para seu terceiro Oscar.

Leia também - mais cinebiografias
Julie e Julia
Johnny e June
O destino mudou sua vida

Lucas Moura

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segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

À beira do caminho

2012 foi um bom ano para o cinema nacional. Mesmo começando mal com o infame As aventuras de Agamenon, o repórter, que apesar de ser uma porcaria teve boa bilheteria e ficou metade do ano em exibição no Cinemark, algumas produções brasileiras ganharam destaque ao longo do ano.  Como sempre, comédia foi o gênero mais produtivo e mais visto, a exemplo de E ai, comeu?, que apesar do título e do roteiro assinado por Bruno Mazeo é bom sim! Chamo a atenção pra três diretores: Fernando Meirelles, Walter Salles e Breno Silveira. Meirelles e Salles são os diretores brasileiros mais bem conceituados no mundo atualmente, e nesse ano ambos lançaram ótimos filmes: Walter Salles lançou Na estrada, produzido por ninguém menos que Francis Ford Coppola, e Fernando Meirelles lançou 360, produção de vários países europeus. E Breno Silveira foi o cara que mais se destacou por aqui: no meio do ano, com À beira do caminho, e em novembro com Gonzaga de pai para filho, que despontou como uma das maiores bilheterias do ano no Brasil.
Em À beira do caminho temos um caminhoneiro chamado João (João Miguel), amargo e em conflito com seu passado. Enquanto viajava pelo sertão da Bahia, João encontra um menino no baú de seu caminhão, e o menino não queria sair de lá. Isso porque ele quer encontrar o pai, agora que sua mãe falecera e segundo ela seu pai havia ido para São Paulo antes dele nascer. João promete deixá-lo em Petrolina, Pernambuco, e de lá ele que se virasse, mas acaba ficando com pena, e por pegar uma carga para São Paulo, decide dar carona ao guri, que se chama Duda (Vinícius Nascimento).
Durante a viagem o menino, que é um tagarela incansável, vai tentando descobrir como é a vida de João, que tá sempre de cara amarrada, mas vai se rendendo aos poucos ao carisma de Duda. As chaves pra descobrir os mistérios que o caminhoneiro esconde são umas fotos que ele guarda de duas mulheres e um cd de Roberto Carlos que ele sempre ouve, principalmente umas quatro músicas específicas.
À beira do caminho foi de longe a maior surpresa que eu tive nos cinemas ano passado. Não imaginava que um filme nacional com a trilha sonora só de músicas de Roberto Carlos - na verdade, o filme foi inspirado por tais músicas, depois é que o diretor correu atrás da autorização de Roberto - pudese ser tão bom; tão bonito, emotivo sem ser apelativo. A história é bem simples, é uma fórmula aparentemente muito usada, mas que tem todas as características do toque do diretor. Em Dois filhos de Francisco Breno Silveira usou muito bem a questão da paternidade, e aqui repetiu o feito, mostrando o desejo de Duda de conhecer o pai, um cara que mesmo sem conhecer o ama, e espera que ele o ame da mesma forma; também há os sentimentos paternos que João desenvolve por ele ao longo do filme. A temática de pais e filhos foi repetida em Gonzaga de pai pra filho, lançado pelo diretor ainda em 2012.
Além do que já foi citado, eu atribuo a qualidade do filme a dois fatores: elenco e trilha sonora. No elenco temos João Miguel, mais uma vez brilhante e mostrando porque é um dos maiores nomes do cinema nacional, e Vinícius Nacimento, que é uma grande revelação. O menino é um ator nato; sabe comover sem precisar chamar a atenção da câmera, tem uma vivacidade enorme e faz um trabalho que é exatamente o que se espera de Duda. Acho que desde Central do Brasil que uma criança não se destaca tanto num filme. E em relação à trilha sonora, não há contestação: as músicas de Roberto Carlos fazem parte da vida dos brasileiros de tal forma que é impossível não se emocionar com Amigo, A distância, Como é grande o meu amor por você ou mesmo O portão, que é minha favorita e é a que mais tem a ver com o longa.

Leia também:
As aventuras de Agamenon
Tropa de Elite

Luís F. Passos

sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

Morangos Silvestres - uma vida em um dia

Milhares de filmes já repetiram a fórmula clássica da “viagem de autoconhecimento”. Uma pessoa, confusa, acaba encontrando-se e aceitando uma determinada condição em sua vida quando resolve botar o pé a estrada e seguir para um lugar novo. Muitos filmes usam disso, mas poucos conseguem elevar essa questão para algo mais significativo, com uma análise realmente pungente sobre questionamentos diversos que afetam não apenas a vida íntima da personagem em questão, mas também problemáticas e dúvidas inerentes ao ser humano. Morangos silvestres (Smultronstället, 1957) consegue fazer isso de forma magistral, numa viagem que não envolve apenas um deslocamento geográfico pela Suécia, como também um mergulho no passado de um velho solitário, a aceitação de sua condição como mortal, a compreensão de sua frieza e até o achado de certo tipo de compaixão aparentemente velada e que pode ser determinante na vida de um jovem casal. 
O velho solitário em questão é Isak Borg (Victor Sjöström) que resolve viajar de carro de sua casa até a cidade de Lund para receber um prêmio na universidade na qual lecionou por mais de 50 anos. No caminho, ele leva consigo sua nora, Marianne (Ingrid Thulin), com quem tem pouco contato e que está numa encruzilhada entre decidir largar ou não seu marido, filho de Isak, por este ser tão frio e distante quanto o pai; três jovens, uma deles chamada Sara (Bibi Andersson), uma garota bonita e entusiasmada que lembra o primeiro e verdadeiro amor de Isak, sua prima de mesmo nome que casou com seu irmão mais velho; um casal de meia idade que não se entende de forma alguma e que remete não apenas ao antigo relacionamento de Isak com sua falecida esposa como também a perspectiva para o futuro do relacionamento de Marianne e seu marido; e muitas, muitas lembranças. 
No período de um dia, Isak corre de encontro ao seu passado. Dizem que para entendermos nossa vida presente devemos buscar as respostas em nossas raízes, ou seja, em nossa infância. É por esse caminho que Freud construiu seu trabalho e também é a esse caminho que Ingmar Bergman recorreu em toda a sua extensa filmografia. Em meio a devaneios, sonhos e simples recordações, Isak viaja para seus anos de juventude, onde encontra a gênese de todo seu conflito. Sua vida de frustrações e solidão tem como semente uma grande desilusão amorosa, uma vida voltada exclusivamente para o trabalho, negando o contato social, e uma relação fria e distante com os pais, que transmitiram essa falta de afeto como se fosse um fator genético.
Morangos silvestres vai levantar ainda vários outros questionamentos. Além do encontro com o passado, temos aqui a clássica dicotomia entre ciência e religião. Tema recorrente na filmografia de Bergman, o cético cientista Isak acompanha a dualidade entre essas duas correntes pela oposição dos dois jovens rapazes que acompanham a alegre Sara, e disputam a atenção desta. Aliás, a relação entre juventude e velhice também é tema do longa. Essa relação não é tratada apenas de forma conflituosa, mostrando divergências de gerações, mas aparece de maneira harmoniosa, onde Isak e os rapazes se entendem de fato. Dialogam, trocam experiências, respeitam-se e estão dispostos a ouvir e aprender uns com os outros. A relação entre a vida e a morte também não poderia ficar de fora. Obviamente, Isak teme a morte e a sente muito próxima a ele a todo o momento, mas passa por todo um processo de aceitação da presença desta.

Leia também: Persona

Lucas Moura

domingo, 13 de janeiro de 2013

Sete dias com Marilyn - a estrela por trás das câmeras

Uma vez o grande diretor Billy Wilder, que dirigiu dois filmes protagonizados por Marilyn Monroe, disse: "a minha tia Minnie é uma pessoa adorável e se ela fosse estrela de cinema ela nunca chegaria atrasada num set. Mas quem iria pagar pra ver minha tia Minnie?" Isso porque por mais dor de cabeça que Marilyn desse pra gravar um filme, o resultado era sensacional, e consequentemente, a bilheteria também. Wilder podia dizer isso com segurança; num de seus trabalhos com a loira, Quanto mais quente melhor (1959), várias cenas precisaram de mais de trinta tomadas para ficar prontas. Em compensação, a incrível peformance dela ajudou a fazer do filme a melhor comédia de todos os tempos.
Em 1957 Marilyn (Michelle Williams) chegou na Inglaterra, recém casada, para gravar um filme com um dos grandes nomes do teatro inglês, Lawrence Olivier (Keneth Branagh), que resolvera produzir, dirigir e protagonizar um filme chamado The prince and the showgirl (no Brasil, O príncipe encantado). Desde o início das gravações ela fez o que fazia sempre: deixava todo mundo doido. Chegava horas atrasada e demorava mais ainda pra sair do camarim, sumia por dias, tinha crises de nervosismo e insegurança, agravadas por seu desejo de seguir o método de Lee Streasberg. Na época Marilyn queria provar que poderia ser uma grande atriz e interpretar grandes personagens que exigissem mais dela do que simplesmeste seus carisma e sensualidades natos.
Acontece que o Lawrence Olivier havia escalado um de seus assistentes, Colin Clark (Eddie Redmayne), pra ser uma espécie de quebra-galho para Marilyn, e na semana em que o marido dela, Arthur Miller (Dougray Scott) precisa voltar aos Estados Unidos, Colin fica todo o tempo com a estrela americana, e é essa semana que o filme destaca. O longa na verdade é baseado em dois livros escritos por Clark, que realmente existiu, sobre o tempo que passou junto a Marilyn Monroe durante as gravações de O príncipe encantado.
O grande mérito de Sete dias com Marilyn (My week with Marilyn, 2011) é a atuação de Michelle Williams. Depois de ganhar o papel, a atriz trabalhou duro por seis meses se preparando para as gravações; buscando se parecer fisicamente com Marilyn, que por ter características fisicas tão conhecidas foi necessário acertar em cada mínimo detalhe ou pareceria falso; também teve de praticar a voz, ler cartas, diários e biografia, tudo pra tentar entrar no universo complexo que era Marilyn Monroe. A atuação de Michelle foi indicada ao Oscar muito merecidamente, pois mesmo sendo impossível reproduzir exatamente o jeito de Marilyn, a atriz conseguiu chegar o mais perto possível, mostrando aquele misto de sensualidade e insegurança que Marilyn fazia como ninguém. E claro, mais uma vez tivemos a certeza: só existiu uma Marilyn. Nunca existirá outra Marilyn.



Leia também:
O pecado mora ao lado
Quanto mais quente melhor

Luís F. Passos

quinta-feira, 10 de janeiro de 2013

Oscar 2013: os indicados

Mais um ano, mais um Oscar. O prêmio da academia completa esse ano seu aniversário de 85 anos, marcados por coroações de grandes produções cinematográficas, homenagens a mestres do cinema, consagrações de atores e atrizes e também muitas, muitas injustiças. Enfim, o que importa é que hoje, dia 10/01, foi divulgada a lista com os indicados ao Oscar deste ano, que conta com a presença de nomes já esperados e com algumas surpresas que agradaram – ou não – muita gente que acompanha a premiação. Os indicados nas principas categorias foram:

Melhor Filme
Amor
Argo
Indomável Sonhadora
Django Livre
Os miseráveis
As aventuras de Pi
Lincoln
O lado bom da vida
A hora mais escura

Assim como ano passado, foram 9 indicados na categoria. Os destaques maiores vão para a superprodução de Spielberg Lincoln – que, desde sempre, era certeza absoluta de indicação por ser a cara dos votantes da academia – e para as surpresas da categoria: Amor e Indomável Sonhadora. Amor é uma produção européia do diretor Michael Haneke que foi o filme vitorioso em Cannes e Indomável Sonhadora é o filme independente do ano. Pra mostrar que não é tão antiquada assim, a academia adora colocar um filme de circuito independente entre os indicados, o que é bom para a divulgação desses filmes que dificilmente teriam um reconhecimento expressivo. Só para citar alguns exemplos, foi assim com Pequena miss Sunshine (2006), Preciosa (2009) e Inverno da alma (2010).

Melhor Diretor
Michael Haneke – Amor
Ang Lee – As aventuras de Pi
David O. Russel – O lado bom da vida
Steven Spielberg – Lincoln
Benh Zeitlin – Indomável Sonhadora

Dos indicados, tanto Ang Lee quanto Spielberg já possuem prêmios de melhor diretor. Ang Lee por O segredo de Brokeback Mountain (2005) e Spielberg por A lista de Schindler (1993) e O resgate do Soldado Ryan (1998). David O. Russel tem uma indicação pelo filme O vencedor (2010). Terceiro Oscar de Spielberg? Provável. Surpresas ficaram por conta da ausência de Kathryn Bigelow (A hora mais escura) e Ben Affleck (Argo), ditos como certos na categoria.

Melhor ator
Daniel Day-Lewis – Lincoln
Joaquin Phoenix – O mestre
Hugh Jackman – Os miseráveis
Denzel Washington – O vôo
Bradley Cooper – O lado bom da vida

Briga de cachorro grande, mas minha aposta vai para Daniel Day-Lewis. Não preciso explicar o porquê, basta ver algum filme em que ele seja protagonista para entender de que estou falando. Ele tem dois prêmios – Meu pé esquerdo (1989) e Sangue negro (2007) – e caminha para o terceiro. Joaquin Phoenix e Denzel Washington também possuem indicações – Joaquin com duas e Denzel com cinco, incluindo duas vitórias – enquanto que Hugh Jackman e Bradley Cooper estão na primeira. Interessante ver Bradley Cooper na lista. É um ator em ascensão.

Melhor atriz
Jessica Chastain – A hora mais escura
Jennifer Lawrence – O lado bom da vida
Emmanuelle Riva – Amor
Quvenzhané Wallis – Indomável sonhadora
Naomi Watts – O impossível

Nem me arrisco a chutar um nome. Das indicadas, só conferi Naomi Watts por O impossível. Tudo indica que o prêmio vai ficar entre Jessica Chastain (indicada a melhor atriz coadjuvante ano passado por Histórias cruzadas) e Jennifer Lawrence. Chastain protagoniza um filme sobre a caça a Bin Laden. Ou seja, bem o estilo de produção que faz sucesso nos EUA enquanto que Lawrence é uma das atuais queridinhas de Hollywood desde que estourou com o sucesso surpreendente de Inverno da Alma (2010), que lhe garantiu uma indicação a este mesmo prêmio (ofuscada por Natalie Portman). As surpresas ficaram por conta de Emmanuelle Riva, oficialmente a atriz mais velha (84 anos) a ser indicada na categoria e principalmente de Quvenzhané Wallis, a atriz mais jovem a ser indica ao Oscar – tem apenas 9 anos de idade, 4 anos a menos que a segunda atriz mais jovem a ser indicada (Keisha Castle Hughes por Encantadora de Baleias, 2003). Além disso, provavelmente foi a presença dela entre as cinco que tirou Marion Cotillard da lista. Isso é muita coisa. Ah, nenhuma das indicadas tem Oscar.

Melhor ator coadjuvante
Alan Arkin – Argo
Philip Seymour Hoffman – O mestre
Robert De Niro – O lado bom da vida
Tommy Lee Jones – Lincoln
Christoph Waltz – Django Livre

Todos nessa categoria tem Oscar. O legal é ver de novo Robert De Niro entre os indicados, já que ele não recebia indicações desde 1991 com Cabo do medo.

Melhor atriz coadjuvante
Amy Adams – O mestre
Sally Field – Lincoln
Helen Hunt – As sessões
Anne Hathaway – Os miseráveis
Jacki Weaver – O lado bom da vida

A surpresa ficou por conta da presença de Jacki Weaver. Helen Hunt volta ao Oscar quinze anos depois de vencer melhor atriz por Melhor é impossível (1997) e Sally Field – vencedora duas vezes do Oscar de melhor atriz – surge depois de quase trinta anos sem indicações. Amy Adams, mais uma vez, aparece entre as indicadas da categoria. E mais uma vez deve perder, pois o favoritismo é todo de Anne Hathaway.

Melhor animação
Frankenweenie
Paranorman
Valente
Piratas pirados
Detona Ralph

Melhor roteiro original
Amor
Django Livre
O vôo
Moonrise Kingdom
A hora mais escura

Melhor roteiro adaptado
Argo
Indomável Sonhadora
As aventuras de Pi
Lincoln
O lado bom da vida

Melhor filme estrangeiro
Amor
Rebelle
No
O amante da rainha
Kon-Tiki

Lucas Moura

terça-feira, 8 de janeiro de 2013

Top 5 - livros em 2012

 Assim como em 2011, farei um pequeno resumo dos livros que mais gostei esse ano. Diferente do ano passado, a lista agora só traz cinco livros - li bem menos que em 2011 - mas acho que compensa o fato de que os títulos de 2012 foram bem melhores. Quero lembrar que essa é uma lista pessoal, cuja referência é a minha preferência; se fosse feita por críticos, a ordem obviamente seria diferente.

5. Mrs Dalloway: um dos primeiros romances de destaque de Virginia Woolf, Mrs Dalloway narra um dia na vida de uma senhora da aristocracia inglesa, Clarissa Dalloway. Mulher de um deputado conservador, Clarissa está prestes a dar uma festa, e em meio aos preparativos, a narração acompanha seus momentos de introspecção em passeios por Londres e reencontros com velhos conhecidos. O livro também acompanha um veterano de guerra que vai enlouquecendo aos poucos, mesmo com todo apoio oferecido por sua mulher. Através de várias personagens, Woolf traça um excelente perfil da sociedade londrina da década de 1920, além, claro, da análise psicológica de diversos elementos dessa sociedade. 

4. O grande Gatsby: chamado de "o grande romance americano", O Grande Gatsby se desenvolve a partir das lembranças de Nicky Carraway, um comerciante que se muda para Long Island e mergulha no incrível mundo dos milionários, onde conhece o misterioso Jay Gatsby. Gatsby é vizinho de Nicky e costuma dar festas suntuosas regadas a muita bebida - em plena época da Lei Seca - buscando atrair a atenção de seu amor do passado. Neste livro Scott Fitzgerald consegue como ninguém descrever a geração dos prósperos e loucos anos 20, uma época de fartura, do American Way of Life; e faz isso criticando a futilidade da sociedade de forma magistral. O grande Gatsby é um romance irresistível, e fiquem atentos! Deve chegar aos cinemas em março a nova versão da obra, estreando Leonardo DiCaprio, Carey Mulligan e Tobey Maguire.

3. A metamorfose: mais que um livro, uma experiência. Kafka apresenta George Samsa, uma caricatura de si mesmo, jovem que num belo dia acorda e inexplicavelmente estava transformado numa espécie de inseto gigante. A metamorfose física dá sequência a metamorfoses no comportamento de George, no comportamento de seus familiares para com ele e na sua forma de ver o mundo. O livro ganha um caráter muito filosófico e profundo, que mesmo hoje, quase cem anos depois de seu lançamento, é inesgotável. Post aqui.

2. 1984: qual o melhor instrumento de dominação? Dinheiro? Armas? Não. O pensamento. É isso o que nos propõe George Orwell em 1984, livro ambientado numa sociedade futurística onde o totalitarismo é extremo e impõe o medo, a alienação e a repressão a níveis inimagináveis. Nessa sociedade vive Winston, funcionário do governo que mantém dentro da própria mente uma luta contra o Partido, e acha que é um dos poucos a praticar o pensamento-crime e claro, esconde isso para proteger sua vida. Winston tenta entender e de alguma forma lutar contra a dominação do Estado, em que tudo é feito coletivamente mas na verdade todos estão sozinhos. 1984, escrito na época da Guerra Fria, é uma crítica aberta aos regimes totalitários (principalmente o governo de Stálin na URSS), mas serve também como alerta para o caminho pelo qual segue a humanidade, podendo perder suas caraterísticas mais humanas sem se dar conta disso. Post aqui.

1. Cem anos de solidão: fazia tempo que eu não me apaixonava por um livro. E quando, enfim, nosso amigo Lucas me cedeu seu exemplar, foi amor à primeira página. O mais famoso livro de Gabriel García Márquez traz a saga da família Buendía, fundadora do povoado de Macondo, através de um século, e acontecimentos como a praga da insônia, o retorno dos mortos, o desaparecimento de um trem cheio de trabalhadores, as chuvas que caíram sem cessar por anos, o tempo paralisado, a destruição da aldeia e como tudo estava previsto desde o início. Loucura, guerra e amor são temas que se repetem ao longo das gerações da família que costuma repetir os nomes de seus homens (há vários Arcadios e Aurelianos). Não há livro como Cem anos de solidão, que provavelmente é o maior livro latino e na língua hispânica só fica atrás de Don Quixote de la Mancha; é sem dúvidas um dos maiores ícones na literatura universal no século XX (principal responsável pelo prêmio Nobel de García Márquez) e um dos maiores sucessos de venda: mais de trinta milhões de exemplares traduzidos em trinta e cinco idiomas.

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Luís F. Passos

domingo, 6 de janeiro de 2013

Top 10 - filmes em 2012

Assim como fiz ano passado, esse ano resolvi analisar tudo o que conferi nos cinemas e elaborar essa singela e pessoal lista dos 10 melhores filmes que vi, no cinema, em 2012. Só pra ressaltar, é uma lista pessoal, ou seja, são os filmes que eu achei mais interessantes, por diversos motivos, dentre os que assisti e esses não são, necessariamente, os melhores filmes do ano.

10. Frankenweenie - Eu adorava Tim Burton. Achava o trabalho dele o máximo e filmes como Edward mãos de tesoura e Beetlejuice realmente têm um grande significado pra mim. No entanto, de uns tempos pra cá eu vinha me decepcionando um pouco com ele. Dois dos seus trabalhos mais recentes, e que tiveram um destaque enorme, foram totalmente decepcionantes para mim. Confesso que não gostei da versão dele de Alice no país das maravilhas e que achei Sombras da noite bem mais ou menos. Sendo assim, quando soube que ele iria produzir uma nova animação, Frankenweenie, fiquei obviamente com um pé atrás. Porém, adorei o filme. Achei excelente. A história reverencia os grandes clássicos do terror, sobretudo Frankenstein, com todos os toques de comédia e elementos típicos atribuídos a Burton, de modo que esse filme é um retorno ao seu modo de fazer filmes estilo anos 90. Além disso, toda a parte técnica que alia a simplicidade do stop motion com a modernidade do 3D funciona muito bem, tornando-o visualmente interessante, tanto quanto A noiva cadáver e O estranho mundo de Jack. Vale muito a pena.

9. Prometheus - Um dos filmes que mais dividiu opiniões em 2012, Prometheus é a volta do diretor Ridley Scott ao ambiente futurístico e espacial onde concebeu uma das maiores obras-primas da ficção científica: Alien, o oitavo passageiro (1979). A semelhança entre Alien e Prometheus é absurda, logicamente, e este perde para o primeiro já que é difícil bater um clássico desse calibre. No entanto, é importante ressaltar que Prometheus pode sim sobreviver por si só. É um filme que tem clima (muito clima), intenso do começo ao fim, com direito a seqüências incríveis lideradas por sua protagonista/heroína (Noomi Rapace), elenco excepcional e efeitos especiais para ninguém botar defeito. Por mais que tenha defeitos no final e que sua conclusão seja mais fraca do que o modo como o filme se encaminhava, adorei o filme. Post aqui. 

8. Tudo pelo poder - Respeito George Clooney como ator e admiro seu trabalho como diretor. Sua visão na direção é mais voltada para dramas políticos de conteúdo e inteligência indiscutíveis. Em Tudo pelo poder, Clooney trabalha com um grande jogo de manipulação e intrigas veladas de um político que almeja o poder a qualquer preço. Em sua escalada, temos um jovem e idealista assessor, Ryan Gosling, um daqueles homens desconhecidos por trás de toda a maquinaria política, que também é um jovem idealista e que vai percorrer uma jornada por verdades indigestas e perda de moralidade. Vale muito apena conferir.
7. Os Descendentes - Desde que assisti Sideways – entre umas e outras (2005) sou fã do trabalho do diretor Alexander Payne. Depois de conferir As confissões de Schimidt (2002) e Eleição (1999) passei a esperar sempre filmes tão ácidos quanto divertidos de seus roteiros criativos e inusitados. Com Os descendentes, seu trabalho mais recente, temos a jornada de um viúvo (George Clooney) buscando aproximar-se de suas filhas enquanto deve resolver questões familiares a respeito de uma grande porção de terra nativa que pode vir a virar um grande complexo hoteleiro australiano. Os descendentes pode não ser tão ácido quanto seus trabalhos anteriores e é mais previsível e mais comportado, mas não deixa de ser uma ótima pedida.

6. O Impossível - A emocionante e visualmente incrível jornada de uma família inglesa para tentar se unir novamente após a catástrofe natural de 2004, onde tsunamis varreram o sudeste asiático, é um filme forte, intenso e impactante, com grande elenco e ótima direção. O impossível se sai bem de duas formas, primeiro com relação à parte técnica envolvendo a chegada das ondas e toda a destruição e desordem subseqüente, como também em sua função nítida de drama. Por mais que haja uma grande manipulação emotiva, um tema como esse permite isso, esse excesso sentimentalista não estraga o filme. Sou fã de Naomi Watts, ela é simplesmente fantástica e O impossível ainda nos traz um nome novo, o jovem Tom Holland, que muitas vezes rouba a cena de Watts e da tragédia em si com sua interpretação excelente. Post aqui.

5. Os Homens que não amavam as mulheres - Outro filme que gerou polêmica esse ano, a versão de David Fincher para o capítulo inicial da trilogia Millenium de Stieg Larson dividiu opiniões, sobretudo numa comparação entre esta versão e a versão sueca (tendo Noomi Rapace no papel principal). Bom, comparações à parte é um filme que gostei bastante. Claro que a história em si é exageradamente sórdida e mirabolante, passeando de abuso sexual a fascismo na Suécia moderna (é importante ressaltar que o movimento fascista sueco era – ou é? – muito forte), mas é importante mesmo perceber a incrível qualidade técnica do filme, garantida pela sempre primorosa e perfeccionista direção de David Fincher e a revelação de uma grande promessa para o cinema dos próximos anos: a jovem atriz Rooney Mara. Coube a ela a caracterização da dificílima e inesquecível Lisbeth Salander, o maior atrativo do filme e quem realmente nos mantém atentos pelas mais de duas horas do longa.

4. As aventuras de Pi - Rendo-me ao 3D. Nunca vi em um filme uma beleza visual tão impressionante quanto a de As aventuras de Pi, filme que conta a história de um jovem rapaz indiano e de sua grande aventura por mais de 200 dias como náufrago à deriva no meio do oceano, confinado num bote salva vidas na companhia, apenas de um tigre de bengala chamado Richard Parker, que é o terror que o mantém vivo e atento. Uma jornada espiritual, sim, mas o que realmente encanta são os efeitos especiais que impressionam qualquer um. Ang Lee elevou a tecnologia do 3D a outro nível, superior ao próprio Avatar (2009) de James Cameron, e cria mais uma de suas produções singulares. Um filme único. Acredite no extraordinário.

3. Batman - O Cavaleiro das Trevas Ressurge - A conclusão da já épica trilogia do homem morcego pelo ponto de vista visionário de Christopher Nolan, o melhor diretor surgido nos anos 2000, é uma jornada intensa do começo ao fim. Apresenta-nos um Batman (Christian Bale) fraco, abatido e fora de atividade que deve superar suas limitações físicas e mentais; um vilão que consegue causar mais caos a Gotham que o próprio Coringa (Heath Ledger); e uma vilã/mocinha sensual, esperta e forte, na nova versão da clássica Mulher Gato (eternizada por Michelle Pfeiffer e aqui interpretada por uma das melhores atrizes do momento, Anne Hathaway). Filme com ar de épico, muito bem dirigido, muito bem produzido, elenco perfeito e que fecha bem a trilogia, fazendo conexões diretas e indiretas com os dois longas antecessores. Não, não é melhor que O cavaleiro das trevas. Post aqui.

2. Drive - Ryan Gosling. Acho que ele é um ator que Hollywood realmente precisa no momento. Por ser um homem bonito e por ter começado em produções de romance (não vamos esquecer que ele é o protagonista de Diário de uma paixão), ele podia muito bem se limitar a fazer apenas esse tipo de filme que agrada muita gente (principalmente mulheres) e atrai muito dinheiro. Mas não. Pelas suas escolhas dá pra notar que há um considerável comprometimento com o valor da interpretação e com a profundidade da personagem. Só para dar alguns exemplos, primeiro ele vem com o solitário Lars (A garota ideal), depois com o problemático Dean (Blue Valentine, filme que deve causar aversão em casais apaixonados) e recentemente aparece como o protagonista sem nome, chamado apenas de Kid ou Driver, de um filme intitulado Drive feito por um diretor europeu (Nicolas Vinding Refn, vencedor do prêmio de direção em Cannes) que é uma das melhores coisas que vi no cinema nos últimos tempos. Fantástico. Um conto moderno e altamente violento sobre um homem misterioso e quieto, que trabalha como “motorista” e dublê de cenas de ação com carros, e sua necessidade de defender sua amada (Carey Mulligan) de grandes perigos que a cercam, e cercam seu filho, quase como se fosse um príncipe defendendo sua donzela indefesa. Drive alterna momentos propositalmente sublimes de romance envoltos a músicas cafonas dos anos 70 ou 80 com explosões pontuais de violência crua e pura que culminam para um final arrebatador. Fantástico. Post aqui.

1. A invenção de Hugo Cabret - Trabalho mais recente do diretor Martin Scorsese (um dos meus diretores preferidos), A invenção de Hugo Cabret traz uma áurea totalmente nova a seu trabalho, mostrando algo único em sua vasta filmografia, mas que, por mais distante que seja de clássicos como Touro indomável e Taxi driver, não deixa nada a dever a outros grandes filmes do diretor e é uma produção excepcional do começo ao fim. Através da obsessão de um garoto órfão por concluir um trabalho deixado pelo seu pai, somos levados a uma aventura (em ótimo 3D) que nos leva muito além da estação de trem de Paris, mas sim para dentro da história do cinema em si quando uma das personagens envolvidas na trama é o próprio George Mélies. Para quem não sabe, Mélies é um dos maiores nomes da sétima arte, tendo sido o pai dos efeitos especiais no cinema que caminharam até o que vemos hoje (As aventuras de Pi não seriam nada sem ele). Dessa forma, o filme passeia pelos primeiros anos do cinema e pelo encantamento que este trouxe, e traz, para o mundo e para as pessoas. De todas as homenagens que Scorsese prestou a sua grande paixão, A invenção de Hugo Cabret é a maior, mais direta e mais encantadora. A mixagem de personagens reais com situações fantasiosas é quase um misto de diversão e informação, dando um caráter quase didático à produção. Filme excepcional que, a meu ver, deveria ter levado o Oscar de melhor filme e/ou melhor diretor. Post aqui.


Lucas Moura

sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

Cisne Negro - lose yourself


Em seu último trabalho lançado, o diretor Dareen Aronofsky mergulha no requintado e selvagem mundo do balé para contar uma história moderna e surpreendente, sobre a incessante busca pela perfeição por uma jovem bailarina, Nina Sayers (interpretada brilhantemente por Natalie Portman) que acaba de ganhar o papel de Swan Queen, no balé clássico O Lago dos Cisnes, algo que é almejado por bailarinas de todo o mundo.
Na história de O Lago dos Cisnes, temos duas mulheres diferentes, envolvidas através de um príncipe: de um lado, a controlada e delicada Odette, o Cisne Branco, que, através de um feitiço, é transformada em um cisne. Para quebrar a maldição, apenas o amor do príncipe. O problema é que este é seduzido pela fatal Odille, o Cisne Negro. Vendo que jamais terá seu amor de volta, Odette decide se matar. Um dos balés mais famosos do mundo, O Lago dos Cisnes representa um grande desafio àquelas que são escolhidas para interpretar o Cisne Branco e o Cisne Negro, pois estes são forças distintas. Uma é a completa oposição da outra. Para uma correta caracterização, a bailarina deve, durante a apresentação, saber transformar-se rapidamente, o que exige toda uma postura e atitudes diferentes, bem como a formação de uma linguagem corporal apropriada. Para isso, é vital que a bailarina tenha, em sua essência, características próprias que pode administrar e dosar conforme o desempenho. Portanto, é muito difícil interpretar o papel.
Thomas Leroy (Vincent Cassel) está à procura de um novo rosto para liderar o balé de Nova York. A antiga primeira bailarina, Beth (Winoma Ryder, numa participação especialíssima, brilhante e muito bem vinda), já está na idade de se aposentar e a companhia de dança precisa urgentemente de uma renovação. Renovação acompanhada de inovação. Ele decide, então, abrir a temporada de espetáculos com uma nova montagem de O Lago dos Cisnes (dando uma versão mais crua à história). Em sua busca pela nova Swan Queen, ele acaba por escolher Nina para cumprir o enorme desafio. Nina é das mais dedicadas e talentosas bailarinas da companhia, e é a melhor para interpretar o Cisne Branco. Tem uma beleza quase lírica e um ar virginal e delicado. Seu maior problema é sua postura altamente controladora (“A única pessoa em seu caminho é você mesmo”). Em busca de uma perfeição quase inalcançável e de se equiparar a Beth, seu maior ponto de referência, ela torna-se muito rígida e fria em sua caracterização. Essa placidez pode até combinar com o Cisne Branco, mas jamais com o Cisne Negro, que representa a perda de controle, liberdade, coragem, atitude e erotismo, uma face que Nina não consegue (e não se permite) mostrar.
As razões para Nina ser desse jeito evidentemente vêm de dentro de casa. Sua mãe (Barbara Hershey) é uma ex-bailarina fracassada que largou o balé por ter ficado grávida. Tamanha frustração, a fez direcionar todos os esforços na carreira da filha, e dominar a vida da menina da forma mais sufocante possível. Ela força a filha a ser ridiculamente infantilizada – quarto rosa, caixas de música, bichos de pelúcia, bolo cheio de glacê... –, não permite que ela tenha nenhum tipo de privacidade e muito menos qualquer tipo de autonomia. Dessa forma, Nina vive num constante estado de pressão por jamais ter tido a oportunidade de libertar-se da presença materna sufocante.
Somado a pressão vinda de dentro de casa, a garota passa a ser seriamente transtornada por Leroy, que tenta, com severidade, fazer com que ela se preocupe menos com a destreza de movimentos e deixe-se seduzir pela dança, confrontando-a sem parar. Também passa a provocá-la sexualmente, para que ela libere o que vem sendo forçada a reprimir desde criança, de modo que é criado uma grande tensão sexual. Além da mãe e de Leroy, Nina ainda sofre com a presença de Beth, por sentir-se a substituindo, e principalmente pela presença da sensual Lily (Mila Kunis), uma nova bailarina, vinda de San Francisco, que, ao contrário de Nina tem o espírito livre e deixa-se conduzir por suas sensações, tornando-a ideal para o Cisne Negro e uma nítida rival na dança e na atenção de Leroy.
Recebendo pressões excessivas de tudo e todos a sua volta, a frágil mentalidade de Nina vai se tornando cada vez mais e mais instável. O equilíbrio que rege sua vida está desfeito. Acompanhamos ao longo do filme diversos delírios psicológicos, que vão se tornando cada vez mais freqüentes e fortes. Pouco a pouco, Nina vai se transformando de “sweet girl” em Cisne Negro. Troca bichos de pelúcia e bolos cheios de glacê por viagens de drogas e sexo (“Where is my sweet girl?!”). Vai perdendo o controle, mas, ao mesmo tempo, perde a linha tênue entre o real e o que é ilusão. Junto com ela, nós, simples espectadores, vamos sendo levados juntos a esse mundo psicótico até chegar a um ponto em que é realmente impossível distinguir o que realmente está acontecendo do que o que não passa de fantasia de uma mente perturbada. 
Em Cisne Negro (Black Swan, 2010), Dareen Aronofsky acerta em cheio. O filme tem um ritmo insano e um roteiro muito bem construído. Oscila entre o drama e o terror psicológico. Os devaneios de Nina são fascinantes e ao mesmo tempo assombrosos, cheios de sofrimento mental e dor física. Quem assiste simplesmente não consegue desviar a atenção do que está se passando na tela e anseia por perder-se junto com a bailarina. Fotografia e trilha sonora são elementos técnicos estrategicamente colocados para aumentar o clímax e manter a tensão sempre elevada. O balé é mostrado muito diferente do modo como o vemos no palco. É exibido como um universo de dor, suor, sangue, humilhações e cobranças.
O elenco é brilhante, e sem ele, dificilmente esse filme seria convincente. Barbara Hershey, Mila Kunis, Winoma Ryder e Vincent Cassel evidentemente são excelentes, mas é Natalie Portman que realmente se sobressai. Ela é simplesmente fenomenal. Poucas vezes pude ver em um filme algo como o que ela mostra com toda sua entrega física e mental a sua personagem. Tem uma capacidade incrível de dominar toda a história, está presente em todas as cenas e faz uma interpretação tão visceral e intensa quanto possível. Seu trabalho lhe rendeu o Oscar de melhor atriz e mais vários outros prêmios e se Aronofsky procurava pela perfeição quando resolveu levar Cisne Negro adiante, ele a encontrou em Natalie.
Um filme sobre a busca pela perfeição. Sobre caminhos obscuros da mente. Sobre como o ser humano reage sobre ambiente de pressão extrema. Sobre obsessões. A um certo momento, Nina diz ter sentido a perfeição. Quando acabou a sessão de Cisne Negro, tive uma sensação bem parecida.

Leia também:
A dama de ferro
As horas
Oscar de melhor atriz

Lucas Moura

quarta-feira, 2 de janeiro de 2013

Os Sofrimentos do Jovem Werther - prescrição do Dr. Goethe

Às vezes, podemos ser tomados por um romantismo primaveril daqueles que se espalham pelo corpo como uma gripe, amolecendo nossa casca e incendiando nossa cabeça na febre amorosa, ao qual certamente somos todos vulneráveis. Nesses tempos é mais do que recomendado um repouso mental acompanhado de um livro quente. Digo tão convicto pois, como podeis notar, permaneço elucidado diante da epidemia, após dois longos dias de tratamento com o mais inflamável dos medicamentos: Werther.
Usado em casos extremos, a obra prima da literatura alemã Os Sofrimentos do Jovem Werther (1774) causou a sua época o suicídio de centenas de jovens por toda a Europa. Sua história abrasiva entre o triângulo amoroso, ao qual participavam o personagem principal Werther, a angelical Carlota e o bom noivo de seu objeto de amor Alberto, renovou a noção de tragédia e deu início a literatura moderna na Alemanha.
Doando seus pensamentos, suas emoções, suas crenças e adaptando seu próprio romance proibido aos seus escritos, Johann Wolfgang Goethe construiu uma das mais famosas tragédias influentes atualmente. Sim, os eventos acontecidos ao desenvolver da narrativa, que chega a nós leitores através da correspondência entre o protagonista e o companheiro de longa data Guilherme, são baseados em uma paixão do autor por uma formosa Charlotte Buff (até o nome de sua querida foi preservado) casada com Johann Kestner, homem que certamente inspirou a elaboração de Alberto.
Ao longo das cartas, vamos conhecendo o sensível Werther, adorador da natureza e da simplicidade das coisas. É um sujeito desligado do materialismo, que não busca riquezas, aprecia a inocência das crianças, romântico ao extremo e, é claro, um devotado artista. O humor deste está muito interligado ao cenário natural, às vezes, dando a impressão do bon-vivant se modificar com ela. Outros aspectos da linha de pensamento do Goethe vão se esclarecendo no texto como a valorização do amor platônico e o enaltecimento do corpo de sua amada, quando, em alguns trechos, deixam implícito que o carnal é uma corrupção do sentimento.
Bem, o nosso tenaz jovem começa sua jornada ao viajar para um lugarejo a fim de tratar dos assuntos financeiros da família. A primeira parte do livro resume-se a exaltação da paisagem do local ao destinatário. Sem muita delonga somos apresentados à graciosa Carlota, que chama a atenção do poeta à primeira vista. Daí as cartas passam a ser mais entusiasmadas, portando longas descrições das roupas até o olhar de sua preferida. Essa alegria esvai assim que o emissor se dá conta que seu afeto estava noiva, fato ignorado no início, mas que ia tomando espaço na sua consciência. A agonia vai predominando e atinge o ápice na ocasião que somos apresentados ao provável “rival” Alberto que retorna de uma viagem e reassume o relacionamento. A surpresa está na postura que os dois adotam diante da situação, tornando a rivalidade em uma amizade delicada.
Decidido a se afastar e esquecer a sua aventura amorosa, Werther assume um cargo na embaixada em outra cidade distante e inicia uma nova fase trabalhando. Mais uma desilusão, afinal não se enquadrava aos valores da “burguesia” e vivia se desentendo com a sociedade acabando por perder seu emprego, mesmo assegurado que vinha fazendo um bom trabalho. Nem uma paixão passageira pôde convencer o intelectual a se adaptar.
Em sua última fase, o nosso infeliz protagonista, acreditando estar recuperado de sua enorme estima por Carlota, regressa à pequena vila para encontrar o casal de amigos agora casados. Principia-se a decadência e a obsessão pelo suicídio do personagem nessa fase. Em um dos diálogos travados entre este e Alberto os dois discutem a razão da morte autoinduzida, sendo o camarada completamente contrário e o poeta um defensor.
Os eventos vão se desenhando até culminar na fatalidade baseada na morte de Karl Jerusalem, noticiada ao Goethe através dos escritos enviados pelo seu amigo Johann pouco antes da ideia do livro surgir. Este é um bom exemplo de como a arte imita a vida e que por sua vez imita a arte, pois logo ao alcançar o estrelato centenas de moços europeus acabaram optando por terminar a própria vida a não poder viver algum amor especial.
Portanto, essa é uma medicação natural recomendada sem restrições para aqueles que, de alguma forma, perderam a fé nas relações mais calorosas e contundentes. A bula com os elementos essenciais eu já vos descrevi agora a responsabilidade é vossa em utilizá-la. Ah! E cuidado: desce que é uma beleza, mas pode acabar entalando na garganta...


Guilherme Patterson