terça-feira, 18 de dezembro de 2012

Shakespeare Apaixonado - filmaço ou um dos maiores erros do Oscar?

Na Londres de 1593, acompanhamos a trajetória de um jovem escritor, cujo trabalho baseia-se, sobretudo, em peças de comédia, que vive às sombras de outro gênio da literatura de sua época e que no momento passa por um dos piores momentos para uma mente criativa: a falta de idéias. Simplesmente não há qualquer inspiração para seu novo trabalho, algo que nem tem nome definido e que pode ser chamado pelo péssimo título de Romeu e Ethel: a filha do pirata. Por mais que não consiga escrever, ele o deve fazer, pois o dono do teatro Rose, um dos principais teatros da cidade, está passando por grave crise financeira e seu gerente Henslowe (Geoffrey Rush) está endividado até o pescoço. A única salvação para todos é que a peça desse jovem escritor seja um enorme sucesso. Ah, seu nome é William Shakespeare (Joseph Fiennes).
Ao mesmo tempo, acompanhamos uma jovem donzela de nome Viola (Gwyneth Paltrow). De família rica, Viola anseia por viver um grande amor e uma grande aventura, muito além das poesias que tanto ama, enquanto encontra-se amarrada a uma tediosa vida de previsibilidade e obrigações. Para piorar, ela está prometida (para não dizer que foi vendida) a um rico proprietário de terras na Virgínia, o antipático e rude Lord Wessex (Colin Firth).
Os caminhos de Will e Viola se cruzam pela primeira vez quando a moça, disfarçada de homem, vai fazer um teste para o papel do protagonista. Will automaticamente vê-se profundamente interessado por aquele rapaz e, após descobrir que ele é a lady Viola (a qual ele já estava se apaixonando, após os dois terem se encontrado durante uma festa) os dois passam a viver um amor profundo, intenso, verdadeiro e proibido. Quanto mais se envolvem, mais o bloqueio criativo de Will vai passando. O vazio que o impedia de seguir com seu trabalho foi preenchido pela entrada de Viola em sua vida e agora o amor dos dois serve de inspiração para o seu maior e mais audacioso trabalho até então. A história tola sobre piratas deu lugar a uma intrincada rivalidade familiar, envolvendo mortes, crimes desentendimentos e um amor impossível. Uma história que se fixou como eterna na literatura e serviu de base para muitas das histórias de romance que a sucederam. Ethel virou Juliet e a nova peça é nada mais que a própria Romeu e Julieta. 
Assim como os amantes da ficção, Will e Viola vão se afundando cada vez mais nos impedimentos da sua relação, que parecem impossíveis de se resolverem e é eminente que eles não conseguirão ficar juntos no final. O que não quer dizer que eles não consigam manter uma conexão entre si por mais distantes que estejam fisicamente.
Essa é a premissa de Shakespeare apaixonado (Shakespeare in Love, 1998). Um filme que dividiu e ainda divide muitas opiniões. Muitos o acham um filme maravilhoso, outros o acham uma grande besteira. Grande parte dessas divergências com relação à qualidade (ou falta desta) de Shakespeare apaixonado podem ser relacionadas, diretamente, ao modo como o filme foi tratado na temporada de premiações daquele ano. Mas, o que seria, afinal, Shakespeare apaixonado? Um grande filme ou um grande erro do Oscar? Atrevo-me a dizer que não se deve rotulá-lo como uma coisa ou outra, pois ele tem um pouco dos dois.
Muitos são os motivos para atribuir a Shakespeare apaixonado a designação de um grande filme, pois ele de fato é. Isso é inegável e existem vários motivos que eu posso utilizar para confirmar isso. O elenco é fantástico, composto por muitos dos atores de maior atividade do fim dos anos 90 (também é um fator que pode tê-lo ajudado, e muito, a conseguir tantas indicações e prêmios ao Oscar); os elementos técnicos são dignos de uma super produção, com figurino impecável, direção de arte belíssima e um ritmo rápido e fluido; o roteiro é interessante, inteligente e constrói uma história cheia de faces, com romance, aventura e doses pontuais de comédia, não relacionada apenas a uma ou outra personagem, mas a todas elas. Todas têm seus momentos divertidos com piadas perspicazes. Aliás, as personagens são todas interessantes, com direito a aparição, inclusive, da rainha Elizabeth I (Judy Dench, num papel que lhe valeu o Oscar de melhor atriz coadjuvante), que aparece de forma cômica, mas não tola.
Mas, quais foram os motivos que levaram essa simpática comédia romântica a ser considerado um dos maiores erros do Oscar? Bom, ele foi um sucesso gigantesco na premiação, recebendo no total 13 indicações sendo 7 prêmios, incluindo melhor filme e melhor atriz. São justamente esses dois prêmios que o tornaram um filme tão mal visto e que até chegam a atrapalhar a percepção de suas qualidades, pois muitos os julgam como dois dos maiores erros da história do Oscar. E, para mim, são. São dois prêmios que realmente não condizem com o filme e muito menos com o ano em questão quando se analisa os concorrentes. Para o prêmio de melhor filme, Shakespeare apaixonado derrubou ninguém mais ninguém menos que O resgate do soldado Ryan (Saving private Ryan, 1998), um dos filmes mais louvados de Spielberg, com uma qualidade técnica indiscutível e um roteiro que privilegia valores morais e de comprometimento com a nação. Sendo assim, como Shakespeare apaixonado ganhou o prêmio? Não faz sentido. Mais incompreensível que a vitória no prêmio de melhor filme é, de longe, a vitória no prêmio de melhor atriz. Pessoalmente, acho mais aceitável ele ter levado melhor filme que melhor atriz. Tive a oportunidade de ver todas as concorrentes de Gwyneth Paltrow pelo prêmio e posso afirmar que pelo menos três delas, Cate Blanchet, Fernanda Montenegro e Emily Watson (sendo a quarta Meryl Streep), desempenharam papéis mais fortes, mais profundos e mais desafiadores que a inocente guerreira Viola. Nada contra Gwyneth, mas aquele Oscar realmente não era dela.
Sendo assim, minha conclusão sobre Shakespeare apaixonado é: um filme bom, leve e divertido, mas que não é tão apaixonante quanto o título propõe e que também não mereceu toda a badalação que recebeu.

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Lucas Moura

Um comentário:

  1. Meu Caro Lucas Moura, do Sagaranando,
    Tomei a liberdade de postar um comentário sobre sua crítica - propositiva - ao filme Shakespeare Apaixonado (Shakespeare in Love)de 1998 e que ganhou sete Oscars em treze indicações, acrescentando detalhes que acredito teriam faltado a sua crítica.
    Direção de John Madden, produção conjunta USA/UK, custo U$ 25 milhões, distribuição da UIP, é o típico filme inglês para ganhar prêmios: roteiro envolvendo Shakespeare em sua fase inicial e as naturais dificuldades do escritor novato, atores ingleses em profusão (só Gwineth Paltrow e Ben Affleck são americanos)e uma boa reprodução dos costumes de época. Como tudo em Shakespeare, o drama se confunde com a comédia mesmo nas tragédias, o que não retira nenhum valor aos textos shakespearianos. Como você, concordo que é um filme leve e não mereceria jamais os sete Oscars que recebeu, principalmente considerando-se os demais concorrentes, apesar da presença de Judi Dench, a 'M' de vários filmes sobre 007.
    Daria nota 3, entre 0 e 10.
    abs.
    Rui Patterson

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