domingo, 17 de julho de 2016

The Rocky Horror Picure Show - don't dream it, be it

Science fiction... double feature 
Dr. X will build a creature
See androids fighting Brad and Janet (...)
Oh-oh at the late night, double feature, picture show

Que os anos 70 foram revolucionários para o cinema, este singelo blog já falou até demais. O que não falamos muito é sobre como a ousadia, liberdade e profundidade da geração que transformou o cinema americano agiu no gênero dos musicais. Enquanto nos anos 50 tínhamos Gene Kelly sapateando inocentemente pela chuva  e nos anos 60 Julie Andrews rodopiava pela relva com crianças, a década de 70 traz musicais bem mais complexos, realistas e bem menos virtuosos. Figuras como Bob Fosse, que em seu filme de estreia Cabaret (1972) contou a história de uma prostituta que sonhava em ser atriz e com isso derrotou ninguém menos que Francis Coppola no Oscar de melhor diretor, são prova da força de uma vertente dos musicais explorada décadas depois em filmes como Moulin Rouge (2001) e Chicago (2002).
If there's one fool for you then I am it, Janet
Now I've one thing to say and that's
Dammit Janet, I love you!
Em meio a vários títulos inesquecíveis, nenhum foi tão singular ou chocante quanto The Rocky Horror Picture Show (1975). Narrado por um criminalista (Charles Gray), o filme acompanha o jovem e virginal casal Brad Majors (Barry Bostwick) e Janet Weiss (Susan Sarandon), que após noivarem decidem visitar o dr Everett Von Scott (Jonathan Adams), professor em cujas aulas eles se conheceram e se apaixonaram. As primeiras cenas são suficientes para traçar um perfil dos dois: inocentes, sonhadores e reprimidos - um perfeito estereótipo de um padrão esperado pela sociedade. Enfim, quando Brad e Janet estão na estrada, em meio a um temporal, um pneu do carro fura e eles saem na chuva em busca de ajuda.
It's just a jump to the left, and then a step to the right (...)
You're spaced out on sensation, like you're under sedation
Let's do the Time Warp again!
Nosso casal de heróis chega a um castelo onde pretendiam se proteger da chuva enquanto esperavam ajuda de alguém. Eles são recebidos pelo sombrio mordomo Riff-Raff (Richard O'Brien), pela irmã dele, a empregada Magenta (Patricia Quinn) e pela copeira Columbia (Little Nell), e se inicialmente acharam o lugar assustador, a impressão passou a ser de bizarrice quando eles entram num salão e veem várias pessoas dançando a Dobra temporal (Time warp), literalmente uma dança do acasalamento. Mas bizarra e chocante mesmo é a chegada do anfitrião da casa, o dr Frank-N-Furter (Tim Curry), um "doce travesti da Transilvânia Transexual" - aparece meio vampiresco, com uma capa enorme, e se revela mais divo que muita drag ao ficar de collant e cinta-liga.
I could show you my favourite obsession:
I've been making a man with blond hair and a tan
And he's good for relieving my tension
Frank conta a Brad e Janet o motivo de tanta festa na noite em que estavam: ele iria apresentar aos convidados sua mais nova e perfeita criação: um homem musculoso e bronzeado feito para satisfazer suas mais íntimas necessidades. Batizado de Rocky, o projeto de Frank tem de músculos o que não tem de cérebro - foi usada parte do cérebro de outra criatura, que inoportunamente aparece enquanto o cientista se maravilhava com seu novo brinquedo pessoal. Os desdobramentos das revelações das intenções e dos feitos de Frank, além da realização de tais intenções, são tão surpreendentes quanto insanos.
Give yourself over to absolute pleasure
Swim the warm waters of sins of the flesh
Erotic nightmares beyond any measure
And sensual daydreams to treasure forever
Can't you just see it? 
Dizer que The Rocky Horror Picture Show é um dos musicais mais memoráveis de todos os tempos não é coisa de fã e nem é pelo fato do quanto ele se afasta de todos os padrões. O filme tem o mérito de abordar os temas que aborda da forma como aborda. Muitos são os filmes que tratam da questão da sexualidade, especialmente da repressão e da descoberta - só para exemplificar, o clássico Repulsa ao sexo (1965) de Polanski ou o contemporâneo e maravilhoso Azul é a cor mais quente (2013); mas a vertente que The Rocky Horror segue é absolutamente singular. Onde mais você vai encontrar um cientista transexual alienígena que não só brinca de Frankstein como ama seduzir os inocentes e colocá-los no mau caminho? Janet é a figura que mais representa a repressão dos próprios impulsos, contida no seu papel de boa moça - até explodir tudo cantando toucha toucha toucha touch me, I wanna be dirty. E mais do que a temática sexual, o filme fala sobre esquisitices e como as pessoas devem abraçar suas esquisitices e particularidades, pois todas são únicas e por mais bizarras que pareçam, todas podem se encaixar no mundo de alguma forma.
I'm a wild and an untamed thing
I'm a bee with a deadly sting
You get a hit and your mind goes ping
Your heart'll pump and your blood will sing
So let the party and the sounds rock on
We're gonna shake it 'till the life has gone
Rose tint my world
Keep me safe from my trouble and pain
O sucesso do musical foi avassalador. Claro que a polêmica em torno dele se instaurou, e o filme chegou a ser banido da África do Sul, além de demorar a chegar em vários países. Por outro lado, ficou quatro anos em cartaz no Reino Unido e mais incrível, até hoje é exibido em um cinema de Munique, na Alemanha, na sessão da meia-noite. É o maior tempo de exibição de um filme de todos os tempos. Além do que já falei acima - e ressaltando o quanto o musical é criativo e singular -, suas músicas chiclete (claro que são chiclete, esse é um musical) são sensacionais. Seja em clima de sedução, de festa ou de terror, a trilha sonora é perfeita para o filme e muito bem interpretada por seu elenco. E por falar nos atores, a primeira pessoa a ser citada obrigatoriamente é Tim Curry, que interpreta Frank. O cara é simplesmente brilhante e sua atuação é soberba. Fazer os trejeitos de Frank metido num espartilho e montado num salto alto não deve ter sido nada fácil; difícil imaginar outra pessoa no papel - e é fato conhecido que Mick Jagger foi pensado para dar vida a Frank. Claro que todo o elenco é ótimo, mas ninguém foi mais inesquecível que Tim Curry. A expectativa agora é em torno do remake feito para a televisão e estrelado por ninguém menos que Laverne Cox. Se Frank já era divo, imagine sendo interpretado por uma diva.
Free to try and find a game (...)
And I realize I'm going home

Nota: 10

Luís F. Passos

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