Hugo é um menino órfão, que vive de pequenos furtos na estação de trem de Paris, sozinho, escondido, consertando os relógios da estação desde que seu pai morreu num incêndio ocorrido no museu em que trabalhava. O menino tem uma fixação: consertar um autômato, uma espécie de robozinho, deixado pelo seu pau antes de morrer. Ele acredita que ao conseguir consertar o autômato, poderá descobrir algum tipo de mensagem que seu pai tenha lhe deixado antes de morrer. Para isso, ele não deve apenas consertar as peças da máquina, como também encontrar uma chave em forma de coração que parece ser capaz de ligar o robô.
A coisa começa a ficar ainda mais problemática quando um senhor, dono de uma loja de brinquedos, chamado Georges (Bem Kingsley) cruza o caminho de Hugo, ao descobrir um caderninho que o garoto possui com vários desenhos que seu pai fez do autômato, o que o deixa misteriosamente perturbado. Além de Georges, também entra na vida de Hugo a jovem Isabele (Chloe Moretz), sobrinha de Georges, viciada em livros e curiosa para viver uma aventura fora deles que entra de cabeça com Hugo em sua missão para descobrir os enigmas relacionados ao autômato.
A questão mais interessante, porém, é que Georges não é ninguém mais ninguém menos que Georges Mélies. Apesar de ser uma figura desconhecida nos dias atuais, Mélies foi uma das primeiras pessoas a ver uma exibição de cinema feita pelos irmãos Lumiére e o pioneiro em empregar efeitos especiais nas películas de cinema. Aí é que o filme começa, então, a misturar ficção e realidade. A medida que Hugo vai desvendando os mistérios do autômato, vamos acompanhando várias e várias referências ao cinema, mais especificamente à relação entre o cinema e as pessoas. ao longo do filme são exibidos vários trechos dos poucos filmes originais feitos por Mélies no início do século XX que não foram destruídos pelo tempo. Assim como em Meia-noite em Paris, A invenção de Hugo Cabret (Hugo, 2011) consegue misturar personagens reais com história fictícia de modo a tornar tudo muito mais interessante.
É notável durante todo o filme o grande carinho que Scorsese tem pelo cinema e o que a sétima arte representa para o diretor. A relação íntima entre Hugo e o cinema, que começou ao ver filmes mudos com seu pai, o momento em que Isabele vai ao cinema pela primeira vez, e os relatos emocionados sobre a importância dos filmes na vida de Mélies não estão ali à toa. Estão ali para mostrar a importância que o cinema tem na vida das pessoas, de como ele é capaz de proporcionar as mais variadas emoções e de como faz parte de nossas vidas.
Através de um filme que é, em sua origem, infantil, Scorsese busca atingir um público totalmente novo e diferente de seus filmes anteriores. Com certeza ele consegue. Sua intenção aqui é provocar nas crianças e nos jovens a admiração e o respeito pela origem do cinema, bem como mostrar-lhes um pouco do que os filmes representaram em sua vida. Mesmo sendo um diretor famoso por filmes extremamente violentos como Touro indomável, Taxi driver e Os bons companheiros, Scorsese mostra toda a sua versatilidade, fazendo algo novo, para um público que nunca antes tinha sido alvo de seus filmes usando todas as qualidades de um grande diretor.
Roteiro excelente, o filme conta com cenas dramáticas, principalmente com relação ao passado trágico e o futuro ainda incerto de Hugo e as decepções e amarguras de um decadente George Mélies, divertidas sequências de ação, com direito a trens desgovernados, doses de comédia na medida certa, lideradas quase sempre pela presença totalmente não convencional de Sasha Barom Cohen (!!!!!!!!!!) que interpreta o inspetor da estação, cuja função é pegar meninos de rua que fazem furtos no local e levá-los para o orfanato (sem, no entanto, tornar-se uma personagem antipática, muito pelo contrário é divertidíssima), bom uso da tecnologia 3D (pela primeira vez usada por Scorcese) e também a presença de um grande elenco.
A invenção de Hugo Cabret usa de toda a tecnologia moderna que temos atualmente para falar nada mais nada menos do que da origem do cinema, de quando tudo isso que vemos hoje começava a ter algum tipo de significado e crescer como algo que poderia sim dar muito certo. Em uma época em que estamos muito acostumados a ver grandes produções hollywoodianas cheias de efeitos especiais e muito pouco conteúdo, Hugo nos mostra que dá sim para aliar tecnologia futurística com histórias ótimas. Além de fazer questão de nos lembrar que não devemos esquecer jamais dos pioneiros da magia do cinema, sem os quais não o teríamos em nossas vidas. Como a campanha do Oscar desse ano afirmou, “there’s a little bit of the movies in all of us”.
Hugo foi um sucesso no Oscar 2012. Indicado em 11 categorias, vencedor em 5 (todas técnicas), também foi indicado a melhor filme e melhor diretor (Scorsese saiu vitorioso no Globo de Ouro pelo filme). Ainda não pude conferir O artista (grande vencedor da noite) mas posso afirmar com certeza que até esse momento, Hugo é, para mim, o melhor filme do ano.
por Lucas Moura
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