A morte de um ator do quilate de Philip Seymour Hoffman é o tipo de fatalidade que entristece milhões de fãs do cinema por todo o mundo. O ator falecido aos 46 anos iniciou sua carreira na televisão em 1991 e no ano seguinte fez sua primeira aparição no cinema, de relativo destaque, em Perfume de mulher; o sucesso foi crescente com o passar dos anos. Em 2005, ao interpretar o escritor Truman Capote no filme Capote foi vencedor do Oscar de melhor ator, além de ser indicado ao Oscar de ator coadjuvante por Jogos de poder (2007), Dúvida (2008) e O Mestre (2012). Três atuações memoráveis, sendo a segunda delas tema de nossa singela homenagem ao grande ator.
O ano é 1964 e na escola católica St. Nicholas, localizada no Bronx, reina a disciplina e a ordem baseada na obediência e no medo, principalmente medo da figura austera da diretora, a irmã Aloysius Beauvier (Meryl Streep), quase uma representação da Igreja pré-Vaticano II, cujo hábito negro e expressão impassível são capazes de dominar os vários alunos da escola. O pároco local, padre Brendan Flynn (Seymour Hoffman) acha um absurdo o tradicionalismo da irmã Aloysius e tenta pôr fim aos rígidos costumes perpetuados pelas freiras que administraram a escola ao longo dos anos. O caráter liberal e o jeito bonachão do padre foram mais que suficientes para que a diretora nunca o aprovasse, somado a outras cismas dela, como as longas unhas dele e sua paixão por doces.
Em meio às mudanças políticas e sociais da época, a escola abre as portas para seu primeiro aluno negro - isso numa comunidade composta por descendentes de irlandeses e italianos. A diretora decide observar o aluno, Donald Miller, de longe já que esperava alguma rejeição por parte dos colegas e incumbe a professora dele, irmã James (Amy Adams), da missão de acompanhar de perto o garoto. O que a jovem freira acaba percebendo não parte dos alunos, mas do padre Flynn: uma atenção especial dedicada a Donald e o fato de tê-lo chamado em sua sala e o menino retornar à classe com um comportamento estranho e hálito alcoólico. Depois da irmã James relatar o ocorrido à irmã Aloysius, não precisou muito tempo para que a superior suspeitasse das intenções do padre e decidisse encontrar a verdade, por mais difícil que fosse.
Dúvida (Doubt, 2008) é basicamente um filme de elenco. Bem escrito e bem dirigido, mas tem toda sua força no trio Streep, Adams e Seymour Hoffman - quarteto na verdade, pois Viola Davis dá um show como a mãe de Donald, na cena em que conversa com a irmã Aloysius, praticamente sua única aparição no filme mas uma das melhores do longa. A discussão entre a sra Miller e a freira é tão brilhante que os poucos minutos de cena foram suficientes para Viola ser indicada ao Oscar de atriz coadjuvante. Quanto aos outros, o trabalho não merece menos que os maiores elogios. Amy Adams, que eu considero uma das melhores atrizes de sua geração, faz a inocente irmã James com perfeição, demonstrando a timidez, os gestos comedidos e a bondade que a impede de acreditar na culpa do padre, apesar da insistência de sua superior. O autoritarismo (e por que não intolerância?) da irmã Aloysius é resultado da dedicação de Meryl Streep à personagem, com os olhos sempre desafiadores e sobrancelhas arqueadas decidida a levar a questão até onde fosse preciso.
Talvez essa seja a melhor atuação de Meryl em muitos anos, melhor até que em A dama de ferro (2011), que deu à atriz seu terceiro Oscar, isso porque a freira de Meryl é algo quase inacreditável. Há uma cena em particular, recheada pela séria discussão entre a irmã e o padre Flynn, em que só falta um matar o outro pelo olhar; cena esta pontuada pelo padre gritando "você não tem provas de nada!" e sendo rebatido por um "mas eu tenho minhas certezas!" da irmã. É de tirar o fôlego. E claro, Philip Seymour Hoffmann está tão incrível quanto Meryl. Impressionante a sintonia entre eles, mesmo que suas personagens se odeiem; cabe a ele se defender contra a verdadeira tempestade que é a acusação da irmã Aloysius com a mesma veemência de sua acusadora e esconder o que ele fez de errado - aliás, ele fez ou não fez? Eis a questão, a principal dúvida entre tantas outras.
Nota: 9,5/ 10
Talvez essa seja a melhor atuação de Meryl em muitos anos, melhor até que em A dama de ferro (2011), que deu à atriz seu terceiro Oscar, isso porque a freira de Meryl é algo quase inacreditável. Há uma cena em particular, recheada pela séria discussão entre a irmã e o padre Flynn, em que só falta um matar o outro pelo olhar; cena esta pontuada pelo padre gritando "você não tem provas de nada!" e sendo rebatido por um "mas eu tenho minhas certezas!" da irmã. É de tirar o fôlego. E claro, Philip Seymour Hoffmann está tão incrível quanto Meryl. Impressionante a sintonia entre eles, mesmo que suas personagens se odeiem; cabe a ele se defender contra a verdadeira tempestade que é a acusação da irmã Aloysius com a mesma veemência de sua acusadora e esconder o que ele fez de errado - aliás, ele fez ou não fez? Eis a questão, a principal dúvida entre tantas outras.
Nota: 9,5/ 10
Luís F. Passos
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