O diretor Baz Luhrmann é famoso no meio cinematográfico por um elemento principal: o exagero. Esse exagero, geralmente, vem acompanhado pela mais pura audácia cinematográfica. Os resultados, no entanto, geralmente não são muito de meu agrado. Austrália é um grande desperdício de tempo, dinheiro e elenco; Romeu + Julieta, apesar de ser de uma grande ousadia por traduzir a linguagem do casal de Verona para um universo suburbano e selvagem (com uma adaptação que mesclava o texto e linguagem shakespearianos com a estética e a ambientação da época e do local onde a história se passava) é tão frenético que seja a ser confuso, além de ser impossível evitar uma sensação de estranhismo (do tipo negativo); Moulin Rouge é um dos melhores musicais dos anos 2000. Foi capaz, praticamente sozinho, de ressuscitar o gênero moribundo dos musicais. Sendo honesto, o único filme de Baz Luhrmann que eu realmente gosto é Moulin Rouge, pois acredito que é o único de seus trabalhos em que todo o exagero se converte mais positivamente. A impressão que tenho sobre o diretor é que ele sabe muito bem como lidar com as sequências de ritmo frenético (não há ninguém que faça isso como ele), mas não sabe dosar essas sequências com momentos de maior pureza e simplicidade. O próprio Moulin Rouge quase se perde nesse caminho.
Sucintamente, a história contada do ponto de vista do jovem Nick Carraway (Tobey Maguire) narra a relação entre ele e um homem, alvo de verdadeira adoração de sua parte: Gatsby (Leonardo Di Caprio). Nick mora vizinho ao palácio de Gatsby e, a partir do momento no qual ouve seu nome pela primeira vez, cria uma conexão e uma curiosidade imediata por este homem. Gatsby é um milionário excêntrico famoso por todos os arredores de Nova York pela sua figura enigmática e, principalmente, pelas festas extravagantes regadas por muita música, dança e bebida que agitam as noites do subúrbio milionário. Mas, quem é esse tal de Gatsby? De onde ele veio? O que ele realmente quer com aquilo tudo? Como ele consegue ser tão rico e influente? Qual o segredo do seu sucesso? As respostas para todas essas perguntas não são entregues de graça, mas sim administradas ao espectador nos momentos certos conforme a trama se desenrola. Esse desenrolar, inclusive, é o que determina a mudança do foco do filme. Num primeiro momento, uma história que parece ser simplesmente uma análise social e comportamental da efervescência e euforia dos anos 20, regados a dinheiro e festanças, acaba se transformando, de maneira consistente, numa análise profunda da personalidade e da alma de um homem, abordando seu lado mais humano, vulnerável e, surpreendentemente inocente e esperançoso, bem como de sua complexa e passional relação com o passado. No meio desse caminho de encontro ao passado, temos Daisy (Carey Mulligan), prima de Nick e esposa do milionário Tom Buchanan (Joel Edgerton), num casamento que sobrevive mais de aparências do que de afeto concreto.
Em relação ao enredo, é só isso que tenho a dizer mesmo, pois qualquer tipo de spoiler pode estragar totalmente a diversão de ver as reviravoltas em O Grande Gatsby. Além do mais, não li o livro e minha análise limita-se exclusivamente ao que vi no filme.
Tecnicamente, como já era de se esperar, é muito acima da média. De maneira mais didática, pode-se dividir O Grande Gatsby em dois momentos principais. Um primeiro, pontuado pelas festanças e exageros; e um segundo, mais introspectivo, no qual os dramas consistentes das personagens se desenrolam e se desenvolvem genuinamente.
Como era de se esperar, Baz Luhrmann esbanja de tudo que o talento e o dinheiro podem trazer para encantar o espectador na primeira parte. Tudo é magnífico. O figurino, a maquiagem, a fotografia e, principalmente a trilha sonora, são espetaculares. Repetindo o feito bem sucedido de Moulin Rouge, a escolha da trilha sonora foi a de utilizar cantores e músicas atuais, apenas mudando a versão de cada música. Dessa forma, o ano pode ser 1922, mas o que embala as noitadas e as emoções são músicas como Back to Black e Crazy in Love, em performances de cantores como Beyoncé, Will.i.am, Jay-Z, Lana Del Rey, Florence and the machine e Jack White. Enfim, uma idéia genial que se mostrou funcional mais uma vez e que aproxima o filme do grande público e ganha vários pontos no quesito popularidade. Vamos dar os méritos pra essa trilha porque é fantástica mesmo. A semelhança com Moulin Rouge se estende por toda essa primeira metade não apenas nesses aspectos, mas também pelo clima festeiro que nos lembra o momento inesquecível em que Satine é apresentada e até mesmo pela introdução do filme. Se em Moulin Rouge tínhamos um Christian desabafando seu sofrimento pela perda de seu ‘sparkling diamond’, em Gatsby, Nick coloca nas páginas tudo o que vivenciou, quase sempre como um observador, naqueles poucos dias de verão ao lado de Gatsby e Daisy.
A segunda metade é onde o filme perde pontos. Por seguir uma linha mais simples, leve e calma, o filme perde um pouco de sua força, pois seu diretor não sabe lidar muito bem com isso. Dessa forma, momentos que poderiam ser sublimes acabam sendo abafados por aquilo que é a maior qualidade da primeira metade do filmes: a extravagância. O excesso é o herói e o vilão de qualquer trabalho de Luhrmann, que não sabe utilizar a máxima de “menos é mais”, inclusive deste aqui. Uma das melhores cenas, que é acompanhada da melhor versão de música utilizada na trilha (a versão espetacular de Jack White para a canção de U2 Love is blindness), apesar de curta é importantíssima, mas não muito interessante devido ao visual e ao quase desperdício da música. Quando a cena começou, esperava um momento de clímax do nível de Roxanne de Moulin Rouge (uma das minhas cenas preferidas do cinema), mas foi uma boa decepção até. Apesar de a conclusão ser ótima, atribuo muito disso ao enredo original escrito pelo próprio Fitzgerald (sim, estou desmerecendo Luhrmann). De um modo geral, o ritmo fica um pouco comprometido. As atuações também se mostram meio discrepantes. Se por um lado, Tobey Maguire e, principalmente, Leonardo Di Caprio e Joel Edgerton (a quem nunca tinha ouvido falar) são fenomenais, Carey Mulligan é legal, porém apática. Como sei que Carey é excelente, atribuo isso à própria personagem, que em vez de ir ganhando mais conteúdo como as demais, vai se mostrando cada vez mais banal – pra dizer o mínimo.
Concluindo: O Grande Gatsby é uma boa adaptação. Visualmente interessante, enredo bem feito, atuações majoritariamente excepcionais, trilha sonora perfeita e uma boa diversão. Só não espero que este vá ser o filme número um de 2013. Aliás, torço para que não seja apesar de vê-lo já como um potencial indicado ao Oscar de melhor filme.
Nota: 8/ 10
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