segunda-feira, 24 de julho de 2017

Para sempre Alice – sobre o Alzheimer



O filme Para sempre Alice (Still Alice, 2014) fala sobre a vida de uma talentosa e intelectual professora universitária de lingüística chamada Alice (Julianne Moore) que, ainda jovem ao redor dos 50 anos de idade, recebe o diagnóstico de ser portadora de uma forma rara, genética e precoce de doença de Alzheimer. O filme, então, recorre o período após este diagnóstico e a forma como Alice, gradativa e inevitavelmente, vai perdendo quase que por completo a pessoa que ela era pelo curso trágico da doença. No meio do caminho, há muito sofrimento pessoal e familiar. Pessoal pela consciência de Alice do quão forte para ela é perder controle da própria mente com a qual literalmente fez sua vida, seu trabalho e construiu seu legado e familiar por toda a crise que um problema como esses numa pessoa central causa, desconcertando, de certa forma, a dinâmica da vida de todos.

Eu, particularmente, não gostei muito de Para sempre Alice. É um filme muito simples e que atinge seus objetivos, mas não me resta muito a dizer sobre ele além do que o que disse acima. Sendo assim, apesar de ser um filme bastante emocional e humano, ele é bastante esquecível, pois não existe nenhum elemento no roteiro ou na direção que consigam destacar totalmente este de dezenas de outros filmes do gênero e assim ele me parece mais um filme genérico sobre doença. O único ponto que dá destaque a Para sempre Alice e que fez com que ele fosse tão bem recebido e falado quando do lançamento é a atuação impecável de Julianne Moore, mas dizer que ela é excelente e uma das melhores atrizes do século XXI é como dizer que o mar é molhado ou que açúcar é doce. É algo inquestionável. O elenco de apoio liderado por Kristen Stewart e Alec Baldwin também está muito bom e em sintonia.

Outro problema que eu tive, pessoalmente, é que eu não conseguia parar de evitar comparações com outros filme sobre doença, mas que não usam a doença do protagonista como único ponto, mas sim como a base para a construção de uma história muito mais ampla e que abre margem para mais análises ou diferentes emoções que não apenas a constatação da nossa fragilidade e o quão difícil e sofrido é o processo da morte. Um exemplo muito bom e que vinha a minha mente o tempo todo é Longe dela (Away from her, 2007), filme em que a protagonista também sofre de Alzheimer, mas no qual a doença é a base para um roteiro que fala muito sobre a quebra de vínculo e o quão difícil é o processo de afastamento em vida quando duas pessoas unidas por décadas passam a ser estranhas. Para sempre Alice não se aprofunda a esse nível. Outros exemplos de filmes que usaram doenças para criar enredos mais amplos podem ser Filadélfia, que através da AIDS falou sobre a homofobia, o preconceito e a falta de informação na sociedade estadunidense dos anos 90 ou até mesmo Melancolia, que faz uma metáfora entre depressão e o fim do mundo. 
Enfim, os caminhos existem, são muitos, e não foram percorridos em Para sempre Alice. Não é necessariamente um problema do filme, mas é algo que eu sinto falta.
Ps: a atuação de Julianne Moore é ótima e foi com ela que venceu o Oscar de melhor atriz. Não dá para dizer que não seja merecido, mas naquele ano havia concorrentes tão boas quanto em filmes muito mais interessantes. Rosamund Pike por Garota exemplar, Marion Cotillard por Dois dias, uma noite e Reese Witherspoon por Livre são opções que me agradariam mais. Moore poderia facilmente ter vencido como atriz coadjuvante naquele ano por Mapa para as estrelas, com o qual venceu o prêmio de atuação feminina em Cannes, mas não foi nem indicada ao Oscar pelo filme, numa sequência de injustiças para um atriz que deveria ter vencido o Oscar de melhor atriz por Longe do paraíso há 15 anos atrás.

Nota: 6/10

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Lucas Moura


sexta-feira, 21 de julho de 2017

Filmes pro final de semana - 21/07

1. Que horas ela volta? (2015)
Premiado no Festival de Sundance, foi a aposta brasileira pro Oscar do ano passado. A história é centrada em Val (Regina Casé), empregada doméstica numa casa de classe média alta em São Paulo que há mais de dez anos deixou sua família em Pernambuco em busca de trabalho que lhe permitisse dar melhores condições ao futuro de sua filha. Val praticamente criou Fabinho (Michel Joesas), filho de seus patrões, que nunca tinham tempo para o menino. Quando a filha de Val, Jéssica (Camila Márdila), chega em São Paulo para fazer o vestibular e fica na casa da família rica, acaba o sossego de Val e da patroa. O interesse que ela desperta nos homens da casa e a insubordinação diante da mãe, que considera uma estranha, cria uma tensão que perdura por boa parte do filme, que trata de maneira brilhante de temas como migração motivada por pobreza, relações familiares e a íntima e complexa relação entre patrões e empregados domésticos (mostrando que casa grande e senzala ainda perduram no País).
Nota: 10
2.  A caça (Jagten, 2012)
Lucas (Mads Mikkelsen) é um professor de jardim de infância que ama seu trabalho, é muito querido por colegas e pais de alunos, e adorado pelas crianças. Ele é muito feliz no seu emprego e na pequena cidade onde vive, apesar do pouco prestígio e retorno financeiro da profissão - fatores que pesaram para o fim de seu casamento, anos atrás. A felicidade da vida de Lucas passa a se esvair quando uma aluna e filha de um de seus melhores amigos, devido a uma série de mal entendidos, o acusa de abuso sexual. Num piscar de olhos, arma-se um circo e o professor de personalidade tão doce é visto como um monstro por toda a cidade, sendo vítima de todo o tipo de agressão por pessoas com as quais cresceu mas que em nenhum momento duvidaram de sua culpa. Um detalhe: o filme não oferece ao espectador nenhuma dúvida da inocência de Lucas, o que aumenta o magnetismo da obra. Um dos melhores filmes que vi em 2014.
Nota: 10
3. Ferrugem e osso (De rouille et d'os, 2012) 
Mais uma afirmação da grande qualidade do cinema francês, Ferrugem e Osso pode ser caracterizado simplesmente como uma história de superação. No entanto, não espere nada de emocionalmente apelativo. Este é um filme muito seco e muito direto em sua proposta. Nada de romantismo, apenas a frieza da realidade. As duas personagens em questão devem passar por profundas mudanças, mas nunca soam emocionalmente manipulativas. O envolvimento que temos com o filme é garantido graças a estranha empatia criada pelas personagens e, principalmente, ao talento indiscutível dos atores, tendo Marion Cotillard como o grande nome da produção – e também a segunda melhor atuação feminina do ano passado (perdendo apenas para Naomi Watts em O impossível).
Nota: 10
4. A viagem de Chihiro (Sen to Chihiro no Kamikakushi, 2001)
Esqueça tudo o que sabe sobre animações. Este encantador filme japonês se apresenta num estilo completamente diferente, cheio de magia, envolvente, mas diferente do que estamos acostumados. Chihiro é uma garota de dez anos que está se mudando. No caminho para a nova casa, seu pai pega um atalho, se perde, e eles vão parar numa pequena vila, que parecia ter uma feira montada. Chihiro se separa de seus pais para conhecer o lugar, e quando volta descobre que eles se tornaram enormes porcos. A menina adentra num mundo misterioso ao conhecer uma casa de banhos para espíritos, sua macabra dona e um simpático garoto que é a única pessoa decidida a ajudá-la. É do tipo de coisa que a gente não consegue explicar, mas sente. O filme tem beleza e sensibilidade ímpares. Ótima experiência.
Nota: 10
5. Glória Feita de Sangue (Paths of Glory, 1957)
Considerado o primeiro grande filme de Stanley Kubrick, este drama ambientado na Primeira Guerra Mundial é baseado na história real de um regimento francês que recebeu ordens de dois generais de honra duvidosa para lançar-se numa missão praticamente suicida. Repelidos por soldados alemães, os franceses mal conseguiram sair das trincheiras. A repercussão negativa do fracasso faz com que seja dada a ordem de execução de soldados do regimento. O comandante da tropa, coronel Dax (Kirk Douglas), assume a defesa de seus comandados e inicia uma luta para que nenhum soldado seja penalizado. O drama de altíssimo nível torna-se um manifesto anti guerra, tenso e emocionante. Palmas para Kirk Douglas, palmas para Kubrick.
Nota: 10