Em 2016 eu superei meu recorde de mais tempo
sem freqüentar salas de cinema – literalmente, fui ao cinema apenas duas vezes
ao longo do ano. Assim, como não queria deixar de fazer minha lista pessoal com
o que vi de mais interessante no ano (já estou em falta por não ter feito a de
2015), trouxe aqui os dez melhores longas que tive o prazer de ver e me
apaixonar nesses últimos meses.
1.
Azul é a cor mais quente (La vie d’Adèle, 2013)
Paixão. Talvez esta seja a melhor palavra para
descrever esse filme memorável sobre um relacionamento avassalador entre duas
mulheres. Interessante, envolvente e erótico, Azul é a cor mais quente destila
doses grandes de amor em toda sua forma, toda sua beleza e toda sua
naturalidade, do começo ao fim. Inesquecível.
O filme que me deixou fissurado pelos anos 80.
O fato de ter demorado tanto tempo sem ter visto O clube dos cinco – tendo
perdido a oportunidade de vê-lo quando criança e adolescente – é algo que
lamento muito. Isso se deve ao fato de que este aqui talvez seja o filme que
melhor dialoga com as peculiaridades e incertezas do universo juvenil.
Baseando-se na construção e posterior desconstrução de estereótipos, O clube
dos cinco nos leva a reflexões sobre a vida e nossos papeis nela, sobre quem
somos e quem gostaríamos de ser. Mais de 30 anos se passaram e este ainda é o
melhor filme do gênero e a obra prima máxima de John Hughes.
Para suprir minha necessidade de sci-fi,
Ex-Machina aparece como uma fábula científica incrível, surpreendente e única.
Não é simplesmente um filme de robôs e seus criadores, mas sim uma obra que
analisa várias camadas da natureza humana (mesmo que artificial). Muito do que
há de melhor e o que há de pior no comportamento humano pode ser percebido em
Ex-Machina. Curiosidade, atração, dissimulação, traição. É um banquete para
quem gosta de um bom filme de personagens muito bem construídos (além de manter
um ar de suspense e um clima de tensão o tempo todo).
4.
Que horas ela volta? (2015)
Uma das melhores pérolas do cinema nacional dos
últimos anos, Que horas ela volta? retrata de maneira quase desconfortavelmente
fiel a realidade de milhares de famílias e trabalhadoras domésticas
brasileiras. Um retrato social ácido, e, principalmente, necessário. Na figura
de Val (Regina Casé) vemos a luta diária e as pequenas e grandes conquistas de
uma pessoa incrivelmente banal no cotidiano do país. Que horas ela volta? dá,
então, voz a toda uma classe e, para mim, é filme obrigatório para todo
brasileiro. Não é sempre que vemos um filme retratar de maneira tão clara e
direta o seu próprio país.
Obra prima de Richard Linklater e um dos filmes
mais comentados dos últimos anos pelos seus longos 12 anos de produção, Boyhood
acompanha todas as trivialidades e todos os grandes momentos da vida de um
garoto comum, cuja vida não é muito especial, nem muito melhor nem muito pior
que a dos outros. Entre suas tragédias e glórias, o mérito de Boyhood é
simplesmente o de retratar a vida (e o processo de amadurecimento) como ela é,
em toda sua simplicidade, banalidade, repetição, monotonia. Em todos seus altos
e baixos e em todos os momentos cotidianos de beleza que escapam a nossos
olhos. É um filme muito bonito e muito bem realizado.
Retrato bizarro sobre Hollywood, Mapa para as
estrelas é um desfile de personagens sórdidas e de moral totalmente
questionável. Superficialidade, violência, arrogância, culpa e desprezo são destilados
num universo de entorpecentes, traições e aparências. Mais uma obra perturbadora de David
Cronenberg, recheada de atuações excelentes com destaque para Julianne Moore,
que venceu o prêmio de atuação feminina em Cannes pelo seu papel neste filme.
7.
Inside Llewyn Davis (2013)
Filme sobre a vida errante de um solitário
cantor de música folk (vivido por Oscar Isaac), entre todos seus altos e
baixos. Bom, mais altos que baixos, visto que é um grande lidar com a difícil
realidade mantida por erros do passado e as dificuldades da vida como artista.
Inside llewyn Davis nos traz de maneira muito interessante o cenário da música
folk em NY dos anos 60 e é um filme dotado de grande sensibilidade, com uma boa
análise de personagem e bons elementos técnicos, que inclui uma excelente
(excelente mesmo) trilha sonora e uma bela e sóbria fotografia.
Divertidíssimo do começo ao fim, Ou tudo ou
nada foi um grande sucesso dos anos 90 e trata sobre um grupo de homens
desempregados e sem grandes expectativas de vida que decidem, já que não tem
muito mais o que perder, ganhar dinheiro como strippers, mesmo com seus corpos
meio caídos de gente comum e suas habilidades nulas de sedução. Não, aqui não
rola nenhum Magic Mike, o que,
justamente, garante boa parte da diversão. Além disso, é um filme muito legal
sobre amizade e companheirismo e um retrato muito mais fiel e melancólico das
falidas cidades industriais inglesas no fim do século XX do que se pode
imaginar a um olhar mais desatento.
Uma das comédias românticas essenciais da
história do cinema. Provavelmente, a melhor comédia romântica dos anos 80.
Apesar de não ser nem um pouco imprevisível, Harry e Sally é tão agradável que
é irresistível, muito disso graças ao roteiro inteligente cheio de piadas
legais e a sintonia perfeita entre Meg Ryan e Billy Crystal. É possível
observar alguns traços de Annie Hall na construção do longa, o que é receita de
sucesso (500 dias com ela, alguém?). É pra ver, se divertir e relaxar como se
estivesse vendo um filme da sessão da tarde em 2002. Tá liberado.
Demorei bastante para ver a saga de Katniss
Everdeen e não sei bem o motivo. De fato, tenho de confessar que subestimei
bastante Jogos Vorazes. Não é apenas
mais uma saga para adolescentes e jovens adultos e muito menos mais um filme
sobre um futuro bizarro. Jogos Vorazes é uma análise social muito interessante
sobre as desigualdades entre as classes sociais, o aspecto nocivo da mídia em
distorcer a realidade, o papel opressor do estado e a banalização da violência
e do absurdo. Tudo isso ainda vem acompanhado com um romance guilty pleasure
clichê como sobremesa.
Lucas Moura