sexta-feira, 16 de janeiro de 2015

Filmes pro final de semana - 16/01

1. 12 anos de escravidão (12 years a slave, 2013)
Terceiro ano seguido em que a seleção de filmes que disputaram a categoria principal do Oscar não me entusiasmou muito. Dos nove filmes desse ano, poucos tinham força suficiente para dar a impressão de que serão lembrados por mais uns anos, dentre eles o vencedor, 12 anos de escravidão. Acompanhando Solomon Northup, negro livre que fora sequestrado e vendido como escravo, o filme consegue ser mais que outra história sobre o trabalho escravo nos Estados Unidos. Primeiro, pelo seu realismo que chega a ser impressionante, como nas cenas de castigos com chicotes ou até mesmo quando um pesado pote de vidro é jogado na testa de uma personagem. Além disso, a história é muito bem amarrada e a direção igualmente boa, coroada com o desempenho formidável do elenco, cujo maior destaque é a coadjuvante Lupita Nyong'o, vencedora do Oscar e (Deus queira!) mais uma promessa da nova geração.
Nota: 9,0/ 10
2. Argo (2012)
Este vencedor do Oscar de melhor filme é uma grande produção muito bacana de se ver e que talvez tenha ganhado merecidamente suas estatuetas de filme, roteiro adaptado, entre outras - e muitos dizem que também merecia a de direção. Mas a meu ver, Argo não resistirá ao tempo, pois é mais um filme muito bom entre outros tantos muito bons. O que não tira nenhum de seus méritos, afinal a história da crise diplomática entre Irã e Estados Unidos que culminou na invasão da embaixada americana, prisão de muitos cidadãos e fuga de alguns diplomatas para a embaixada canadense foi algo impressionante, e tudo foi história real. A partir de um plano um tanto mirabolante do agente da CIA Tony Mendez (Ben Affleck), surge esperança para os diplomatas deixarem o país: Mendez vai para o Irã disfarçado de diretor de cinema após a agência criar em Hollywood uma pequena produtora ficíticia e elaborar o roteiro de um filme de ficção científica chamado Argo, que seria rodado no país dos aiatolás. E durante o filme fica aquela tensão constante, mas as coisas são meio previsíveis. Alguém além de mim preferia Django livre ou Amor?
Nota: 8,5/ 10
3. O Artista (The Artist, 2011)
O som chegou ao cinema em 1927; o primeiro Oscar ocorreu em 1928, único ano em que um filme mudou ganhou o prêmio principal - até 2012, quando O Artista venceu melhor filme. O longa franco-belga trata justamente da chegada do som às telonas e do impacto causado a muitos atores, no caso o protagonista, George Valentin (Jean Dujardin), maior astro de Hollywood e totalmente averso ao cinema falado. O filme acompanha a queda brusca de Valentin, ao mesmo tempo em que um novo rosto, Peppy Miller (Bérénice Bejo) faz sucesso nos inovadores talkies. Talvez o maior mérito de O Artista seja não caricaturar os filmes antigos, mas imitá-los com perfeição: desde as interpretações cheias de caras e bocas com legendas expressando os diálogos até a trilha sonora jazzística, além de várias referências ao cinema clássico.
Nota: 8,5/ 10
4. A rede social (The social network, 2010)
Falar em Oscar faz lembrar do ano que talvez foi o mais forte do século 21 no que diz respeito à lista de indicados a melhor filme - apesar de um dos mais fracos ter vencido. Entre as melhores opções, A rede social, talvez o melhor trabalho de David Fincher desde Clube da luta (1999). Pra quem ainda não viu, uma frase resume tudo: não é só um filme sobre a criação do Facebook. Na verdade, o nascimento de um dos maiores sites do mundo é só o plano de fundo para Fincher explorar o que se passa na mente dos jovens de uma geração brilhante que soube muito cedo o que é fama, poder, dinheiro, mas obviamente pagou um preço por isso. É como diz um dos mais conhecidos pôsteres do longa: você não ganha quinhentos milhões de amigos sem fazer alguns inimigos. É fato conhecido a briga entre Mark Zuckerberg e o brasileiro Eduardo Saverin, co-criadores do site, antes colegas de quarto em Harvard, depois que o Facebook ganhou fama e começou a render dinheiro. Fim de uma grande amizade, início de uma era. A era Facebook.
Nota: 9,5/ 10
5. Amor sem escalas (Up in the air, 2009)
 Ryan (George Clooney) é um profissional de uma empresa que é contratada por outras empresas para demitir seus empregados. Todos os dias ele fica de frente a dezenas de pessoas que nunca viu na vida e diz "seus serviços não são mais necessários". E de um trabalho para outro, Ryan viaja de avião, seu maior prazer. A cada ano ele passa quase trezentos dias fora de casa - aliás, é realmente sua casa? Para ele, seu lar são os aeroportos, as salas de espera, as confortáveis poltronas executivas da American Airlines. Tudo na vida de Ryan é emprego, voo, e a meta de acumular dez milhões de milhas aéreas. Para mudar isso, surge o casamento de sua irmã caçula e uma nova colega de trabalho que tem ideias que podem mudar radicalmente seu estilo de vida. Uma ótima reflexão sobre a vida que cada um quer levar e sobre a crise econômica de 2008/09.
Nota: 9,5 / 10

Luís F. Passos

domingo, 11 de janeiro de 2015

TOP 10 - Filmes em 2014


Como em 2014 acabei indo pouco ao cinema e vendo basicamente filmes que eu já tinha assistido (obrigado, Clássicos Cinemark!) ou produções não tão boas assim, acabei fazendo este top 10 – meu primeiro post em 2015 e também em muito tempo aqui no blog – trazendo alguns dos filmes que vi, de modo geral, em 2014. Os únicos critérios de inclusão relacionados a esta seleção são que todos são filmes eu julguei como excelente e assisti pela primeira vez em 2014 (se fosse considerar entre filmes que já vi em anos anteriores, a lista com certeza seria bem diferente). Enfim, aqui vai minha singela seleção:

10. Praia do futuro (2014)


Excelente produção nacional com a assinatura do muito talentoso diretor Karim Ainouz trouxe uma grande polêmica desnecessária e vergonhosa ao cinema nacional, o que o tornou, na mesma medida, um dos filmes mais comentados do ano de 2014. Esses comentários, infelizmente, centraram-se mais no seu conteúdo “polêmico” do que por sua qualidade em si. O fato é que é brilhante a história de autodescobrimento de Donato (Wagner Moura), uma figura tão heroica na visão de seu irmão mais jovem, Ayrton (Jesuíta Barbosa. Ator sensacional) que na verdade encontra-se dividido entre as expectativas e pressões externas e seus desejos, anseios e, principalmente, medos que o levam a tomar guinadas inesperadas e extremistas em sua vida é uma produção bastante intimista e muito forte em sua temática, bem como em seu visual memorável. Filme nacional imperdível de 2014, para mostrar a todos que ainda acreditam que cinema nacional é só baixaria que nosso cinema é muito competente sim.
9. Loucamente apaixonados (Like crazy, 2011)

Meu atual protegido. Loucamente apaixonados centra-se no amor intenso de um jovem casal que parece, simplesmente, perfeito um para o outro. A questão aqui é que este não é um filme de romance tradicional, então, não, o amor não é o bastante. Entre Anna e Jacob existem vários impedimentos que só os afastam cada vez mais. Por mais que seja tentador se render aos desejos pessoais, todos sabemos que o mundo, na maioria das vezes, conspira contra nossa felicidade plena. Então, entre o casal temos impedimentos diversos, mas todos muito aplicáveis à vida real. Impedimentos geográficos, laborais, pessoais e, principalmente, burocráticos (poucas coisas são piores que burocracia excessiva) acabam distanciando bastante o casal. Até quando o amor é capaz de suportar ao tempo, à distância, à solidão e às frustrações? Um filme visualmente muito belo com atores bastante entrosados. Um romance intimista, delicado, simples e bastante palpável. Não tem a força dramática de um Blue Valentine, mas ainda se propõe a caracterizar o amor de uma maneira real e moderna, sem deixar de lado a face bucólica e a melancolia. 

8. Darling – a que amou demais (Darling, 1965)
Passei anos tentando encontrar este filme para download e só consegui fazê-lo em 2014 – foi o primeiro filme que vi no ano. A espera com certeza valeu a pena e, apesar do enredo ser algo totalmente diferente do que eu podia imaginar, Darling se mostrou um filme excepcional. Apesar do título absurdamente dramático, um filme de nuances e cinismo que se centra numa das protagonistas mais egocêntricas e aproveitadoras que já vi. Julie Christie dá vida a sensual e esperta Diana Scott, uma mulher capaz de tudo para conseguir o que ela quer. O único problema é: o que ela quer? Insatisfeita crônica, Diana usa todos a sua volta para conseguir suprir seus desejos frívolos. Enfim, um estudo de personalidade perfeito com a elegância que só o cinema inglês possui, Darling ainda é bastante moderno e ousado para sua época – muitas insinuações sexuais sem qualquer descrição e personagens homossexuais também podem ser observados na trama. Vencedor do Oscar de melhor atriz.
7. Martha Marcy May Marlene (2011)
Desconfortável. Instigante. Ousado. Misterioso. Todos esses adjetivos podem ser aplicados a nebulosa trama de Martha Marcy May Marlene. Num momento inspirado e definidor de carreira, a jovem promissora Elizabeth Olsen (já fez umas bobagens de lá pra cá) nos traz um conto forte e cruel através de um relato pouco preciso da vida dentro de um culto secreto e violento em algum fazenda no meio de lugar nenhum. O filme apresenta seu tema através das memórias confusas da destruída Martha (ou Marcy May? Ou Marlene?) após sua fuga da organização. Tão interessante quanto o retrato cortado do cotidiano no grupo é a relação conturbada e muito mal explicada entre Martha e sua irmã (Sarah Paulson). Um filme que não se preocupa hora nenhuma em dar respostas ao espectador, Martha Marcy May Marlene, como já disse anteriormente no post completo dedicado a este, é como a ponta de um iceberg.

6. Equus (1977)
Fantástica adaptação da peça teatral homônima, Equus alia o talento lendário de Richard Burton como protagonista e o talento lendário de Sidney Lumet na direção. O filme conta a história e a relação intricadas entre um jovem com delírios psicóticos que incluem, principalmente, uma alucinada adoração a cavalos, e seu psiquiatra (Burton), confuso e pessoalmente afetado pela maneira com a qual o rapaz se entrega a seu objeto de adoração e a seus desejos mais profundos. Um mergulho meio perturbador numa mente psicótica, Equus é chocante, mas ao mesmo tempo impossível de desviar os olhos. A trama prende o espectador o tempo todo e também nos leva a refletir sobre temas contundentes. Obra indispensável.

5. O lobo de Wall Street (The Wolf of Wall Street, 2013)

Scorsese é Scorsese. Na sua última produção, o diretor retoma a parceria genial com Leonardo DiCaprio para fazer sua obra-prima do exagero. E quanto exagero. Contando a vida e obra de Jordan Belfort, uma figura das finanças que fez sua fortuna por modos muito pouco tradicionais, digamos assim, Scorsese abusa de tudo, principalmente de sua genialidade. A estrutura de edição e técnica do filme remete ao estilo do diretor, assim como pontos na trama que lembram os fãs de obras anteriores como Os bons companheiros e Cassino, mas em O lobo de Wall Street Scorsese bombardeia o espectador com palavrões, sexo, drogas, sexo, drogas, palavrões, drogas, sexo, sexo, drogas, palavrões, palavrões, palavrões e, pra finalizar, mais um pouquinho de sexo e drogas. Ufa. O ponto é que todo esse exagero imoral torna a trama divertidíssima, bastante interessante e muito criativa. Um filme mais cômico que o normal para os padrões de Scorsese que não deixa muito a dever a outros grandes títulos do diretor – sinceramente o vejo como o melhor trabalho de Scorsese dos anos 2000 pra cá (talvez não por causa de Os infiltrados). A cereja e ¾ do bolo é a atuação brilhante de Leonardo DiCpario, mais digna que qualquer Oscar. Digna de respeito e admiração. Parabéns Leo e Martin pelo filme mais divertido dos últimos tempos.

4. A caça (Jagten, 2012)
Um martírio para o espectador. O sofrimento do nosso inocente protagonista, acusado de cometer um crime terrível, é uma crueldade que parece que não vai ter fim. O grande ponto em A caça não é o crime não cometido em si, mas é que nós, como espectadores, sabemos desde o primeiro minuto que tudo aquilo não passou de uma sequência de desentendimentos. Então, durante todos os minutos de sofrimento de Lucas (Mads Mikelsen, genial) sabemos o tamanho da injustiça que ele está sofrendo. E não é pouca. Humilhações, agressão física, tortura psicológica e desprezo social são capazes de destruir qualquer pessoa. Uma genuinamente boa e inocente então, ainda pior. Assistir A caça é quase um exercício de autocontrole, pois ver tal atrocidade chega a ser revoltante. Filme de fortíssimas emoções, não o recomendo para pessoas muito sensíveis, pois até as mais duronas se sensibilizam com Lucas. Porém, devo dizer que aqui está um dos melhores filmes dos últimos cinco anos, e, se o cinema como arte deve nos fazer sentir alguma coisa, A caça nos traz sentimentos bastante fortes pra dizer o mínimo.
3. Através de um espelho (Såsom i en spegel, 1961)
Primeiro capítulo da famosa trilogia do silêncio de Bergman, Através de um espelho é provavelmente um dos melhores filmes do diretor. Com temática ampla e inovadora, traz questionamentos genuínos ao espectador relacionados a um ponto central: comunicação. Mais detalhadamente ainda, a falta de comunicação entre as pessoas e com deus, o nome a que gritamos no escuro esperando ouvir alguma resposta, que, aparentemente, jamais vem. Com apenas quatro personagens confinados numa casa isolados do resto do mundo, Bergman vai os emergindo cada vez mais em seus sofrimentos e suas frustrações. O que no primeiro minuto pareceu uma feliz família, na verdade é composta por um escritor egocêntrico e insensível, seus dois filhos – uma esquizofrênica e um adolescente tragado pela loucura da irmã e distância do pai – e o marido de sua filha, derrotado pela incapacidade de controlar a doença da mesma. Uma obra de arte em todos os sentidos, obrigatória para cinéfilos.

2. O sétimo selo (Det sjunde inseglet, 1957)
É estranho, mas demorei um bom tempo para ver o filme mais famoso de Ingmar Bergman. O sétimo selo é um dos trabalhos mais inovadores do cinema, trazendo para o comodismo dos anos 50 um universo totalmente novo de possibilidades a serem exploradas. Uma trama complexa centrada num dos períodos mais negros da humanidade, é com O sétimo selo que Bergman começa a abranger com maior totalidade sua temática preferida: deus. Mais que deus, o silêncio de deus e o questionamento por sua existência ou não. O jogo de xadrez de vida ou morte é uma marca forte na mente cinéfila e uma metáfora perfeita para nossa relação infelizmente íntima com a mesma. A morte, inclusive, é personagem vital para a trama de O sétimo selo, que nos lembra bem da fragilidade de nossa existência e da ausência de respostas sobre o que há além da vida. Melancólico, pesado e sombrio, também traz momentos de leveza e até uma metáfora à algo como uma família sagrada – Bergman sempre entre a fé cristã e a negação de Deus. Indispensável.
1. A onda (Die Welle, 2008)
Eu devo ter gostado muito desta produção alemã para ter colocado-a acima de dois dos maiores filmes de Bergman. Claro que isso não é sem motivo. Sou um grande fã do cinema alemão e acho que, atualmente, é a indústria cinematográfica mais engajada em instigar o espectador dentro do circuito do cinema europeu. Extremamente ousado e audacioso, A onda é um tapa na cara de nossa petulância de nos acharmos muito superiores ao período mais cruel do século XX – o nazismo. Não necessariamente o nazismo, mas o fascismo em si. De um aparentemente simples trabalho de escola sobre vivência numa organização fascista, a organização estudantil, como uma onda, toma proporções desastrosas e perigosas que só podem levar a um caminho de destruição. Vivemos numa época em que acreditamos termos superado os erros do passado e muitos consideram impensável que algo como o nazismo possa acontecer de novo, mas A onda nos prova o quão próxima a humanidade é do extremismo, seja de qual tipo for. Só precisamos de um pequeno estímulo para romper com esse aparente equilíbrio em que vivemos. Desagradável, porém uma lição que merece ser aprendida. Não, não somos superiores. 

Lucas Moura